ORAÇÃO DO AMOR

Senhor de Todos os Sentimentos,

De Todas as Alegrias, de Todos os Amores,

Estou eu aqui implorando, neste momento,

De pés juntos jurando por tudo o que é santo

Que jamais derramarei uma lágrima siquer

Pelo amor que me fizer chorar e sofrer dores,

Que me obrigue a compor canções e poesias

Que arrepiem-me todo e me faça mandar flores,

Que jamais me porei a fazer desenhos ridículos,

De corações flechados a olhos oblíquos,

Justo agora que havia me curado de um amor insano,

Daqueles que te fazem voar mesmo sem aeroplano,

Que não me porei em testes por uns lábios rubros

Que incendiaram minha boca, me iluminaram no escuro,

Declaro em sã mente e corpo ainda mais que são

Que não deixarei que ande à borda de um precipício

Este meu vermelho e pulsante e insensato coração,

Pois todo amor verdadeiro tem no fundo um quê de eclipse,

Não me perderei em mapas, em equinócios e solstícios,

Muito menos saltarei de prédios traçando uma elipse,

Eu que ando tanto pela estrada da vida a sonhar futuros

Em peles morenas ou claras ou olhos claros ou escuros,

Deixe que eu descanse ao menos bem mais que um mês

Vagando pelas ruelas e avenidas e becos e botecos,

Quero apenas dançar ao som do cavaquinho e do reco-reco,

Senhor de Todos os Sentimentos, te peço humildemente

Que não dê corda, hoje, no relógio que regula o amor,

Quem sabe mais à tardinha, de chopp na mão e caipirinha

Eu possa de novo me aventurar por um sorriso de caramelo,

Cabelos longos ou curtos, ela deve ter gosto de marshmallow

E, na pior das hipóteses, declarar-se livre e inocente

De todo ato de partir corações, quebrá-los com os dentes,

Anuviado e pensando ser o único e absoluto dono da situação

Me porei em risco novamente me entregando à mulher

Que saiba me envolver com seu sorriso que escandaliza,

Que recite sonetos do grande poeta inglês Shakespeare,

Que eu vou adorando-a como Da Vinci a Monalisa.