Letícia

Tarde de chuva

agosto

Brilha de luz o asfalto

Os carros passam

Espero.

Guarda-chuvas

escondem problemas.

Ela desce do táxi

Cabelo curto

como de rapaz,

Loira como trigo.

Capa de chuva

Curta até os joelhos

Botinhas pretas.

Caminhamos

cinema.

Ela chorou com Jean Louis Trintingnat,

Eu emocionei com Annouk Aimeé...

Depois, à avenida...

Bar,

dois cafezinhos;

Nos entendemos.

Meu quarto

Conversamos, rimos,

Cautela de primeira vez

Nos amamos.

Sofremos a dor

Virgindade perdida.

Felizes aquela tarde

Um amor lindo

A chuva na vidraça.

Choramos,

tempo curto,

O relógio teimava por correr.

.......................................

Uma tarde igual

O telefone tocou

Seu irmão disse

–Sua doença é fatal.

Três meses no máximo.

Novembro terminava

e aconteceu.

A leucemia levou minha Letícia

E deixou esta pedra

Aqui onde estava antes

meu coração.

Por isso, em agosto,

Nunca vou a Montevidéu.

Por isso,

Nas tardes em que a chuva

bate na vidraça,

Bebo, choro e lembro;

Da época em que era feliz.

Agosto, 1973.

Antwerp, Bélgica.

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Páginas da Memória - Livro Inêdito.

Gabriel Solís
Enviado por Gabriel Solís em 27/02/2007
Reeditado em 08/01/2017
Código do texto: T395594
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