Meu pé de Jacaranda

Lá no fundo do meu quintal

Plantei um pé de jacaranda

Meu pequeno violáceo que em cedo argüia contra o sol qual brilho em lume suspirava em fado

Erguia-se esbelto e forte e lá ruflavam os jaçanãs

Os seus dorsos vermelho-castanhos vivos

A cauda mais escura e o restante de um negrume fugidio

Mergulhava no céu azul claro,

Camuflado na vermelhidão vespertina que pairava a uma certa distância

E me olhava ressabiado

Ave maldita! Quem te ensinou a desvendar meus mistérios?

O céu olhava pra Terra e a Terra olhava para o céu

Meu coração voava como um fogo dorsal

Acastanhado pela fadiga que trazia da noite

Mas do verde terrestre, trazia o rêmiges das mãos verde-claras e pontas pretas

E vivia lá no fundo do meu quintal

Pois que amava meu pé de jacaranda

Fechei cada um dos olhos e observei nesta isopia,

Que as folhas penadas caíam e que um lume inflamava

Desde o capim verde até a madeira escura, de desenhos variados

Imaginei as aves do céu no casco da madeira de lei, tal qual os vi

Nas nuvenzinhas que passavam e ofuscavam o sol

Num dia desses, em chamas chorava soturno meu pezinho de jacaranda. E esvoaçavam triste os jaçanãs

Aquelas pequenas flores, aquele legume alado e lenhoso tinha nele desenhado em letras douradas,

O epitáfio de sua existência

E quando tombou totalmente na lápide feito grama, vi a fumacinha

Enegrecendo meus jaçanãs, naqueles ares alados, naquela tarde fagueira, naquela viçosa fogueira.

Ave maldita ! Não vá embora sem antes devolver-me o coração

Ó fogo dorsal de perianto vermelho escuro. Que carregas?

A tristeza solitária de uma flor-de-lis? Dá-me seus ornamentos heráldicos, sê-me como lírio estalizado,

Sê-me o crepúsculo ensangüentado, tão somente a minha flor

A flor-de-abril, a flor-de-maio, a flor-d’água, de coral, do imperador, a flor-da-paixão

Mas foi-se meu coração (que a ave furtou) junto à fumaça que emergia sem que eu soubesse porque.

Foi-se até uma estrela qualquer e à noite, ali desapareceu

Sempre, sempre me lembrarei de ti, ó ave malvada, pois que vivo triste

Sim, vivo triste e incerto.

Desde o dia em que se foi o meu pé de jacaranda

jairomellis
Enviado por jairomellis em 14/03/2007
Reeditado em 15/03/2007
Código do texto: T412797
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