O PALHAÇO E A TRAPEZISTA

Surgiu o palhaço diante da plateia

E tinha os olhos felizes e o nariz encarnado

Brilhava redondo no rosto crivado

Um coração como ornato de gota em centelha .

Subiu na banqueta fazendo algazarra

Chamando a gente com grande entusiasmo

Dançava contente com a sua guitarra

A alegria de ser tão querido do povo.

O que não sabiam é que aquele palhaço

Vivia feliz porque amava uma bela

E gentil trapezista de graça singela

Que voava bem alto em gestos tranquilos

Como um pássaro a amiga subia ao alto

Em direção ao sublime alcance da abóbada

E ele a via descer graciosamente em seu porte

de doces trejeitos ao vazio da morte.

E o coração dele parava no momento

Em que o tempo deixava de correr suas cenas

Mas não existiam barreiras que a impedissem

E ela ressurgia em figura de estrela plena.

Leve e de olhos transparentes

E plumagem nobre e branca

em sua pureza de heroína que brilha

Os olhos eram todos de admiração por ela.

Ah, palhaço, saberia ela que você a admira

Por detrás das cortinas escuras do oculto?

E que aperta as mãos na agonia de não se saber amado?

Olha, palhaço, a linda flor em sua lapela

Que se abre em lindas cores de girassol

E saberás que não há coração maior que o teu.

Mas um dia em que o céu se fechava em estranhas nuvens

Viu surgir em meio ao circo um elegante ilusionista

De terno engomado e chapéu bem alto

Longa capa reluzente e olhar enviesado.

Tinha os bigodes rigorosamente voltados

para o alto do seu sorriso impudente

E as palavras lhe saiam facilmente

E se movia com elegância sedutora.

E o palhaço viu quando ele prendeu

Sua graciosa trapezista no olhar

E a convenceu com vil astúcia e sedução

Do poder que ele guardava em suas mãos.

As cartas saíam de suas mangas como encanto

E a esfera reluzente levitava ao mando de sua voz

mostrando maravilhas que a deixavam admirada

Aos poucos o palhaço viu sua amada se ausentar

E a águia já não pairava no ar de sua felicidade

E já não era mais branca senão sombra de embuste

Que teve a vida suspensa e o sopro roubado.

E o ilusionista se foi

E assim como chegou não houve alarde

Levou consigo a estrela do espetáculo

A trapezista enredada no ardil de seus braços.

E o palhaço em meio ao picadeiro ficou

Com um beiço caído e os olhos marejados

Tinha nas mãos ainda segura uma pluma

Que se perdera das asas do pássaro amado.

A plateia observava esperando o desfecho

Do grande desgosto que sofria o palhaço

Mas ele juntou sua força e coragem

E subiu como a amada pela escada bem alto

Subiu subiu subiu

Subiu tanto que a multidão

já não enxergava o brilho do nariz

E de lá cima com um grande pesar

Estampado no rosto o palhaço gritou

Com a boca escancarada: “ADEUS VIDA CRUEL!!

E numa grande pirueta se jogou do arranha-céu

E a multidão se levantou para aplaudir

Admirada com a atuação fantástica

E com a cara espantada do palhaço

Surpreso com a cama elástica.