Busco o regaço das esquinas

Ergo-me num plano amplo, largo e lácteo,

de um céu bolinado às torrentes do teu olhar.

Elevo-me amuralhada em grades de cimento

na noite incendiada dos meus olhos,

com um sorriso dionisíaco de quem escolhe arestas,

de quem recolhe vampírico sangue

da fonte salgada das palavras

e delas, sequioso, abocanha o alimento

essencial em maternal seio.

Ergo-me, neste enleio, num adeus de mim

vazio,

ao mistério alterado de um rio a correr p’ra norte

Em busca de si e do seu veio

Em busca de um colo

De um fértil solo

De um abraço inteiro, de um só beijo, ardente.

Busco o regaço das esquinas, ávida, descalça e nua,

nas ruas e nas rugas

abertas ao vergão das lágrimas.

Estas, depositadas aluviões em tuas margens

brandas.

Lágrimas inócuas, invisíveis, incolores,

interiores.

Quinas cristalizadas d’ansiedades, d’ agonias –

somatórios maiores de milenares dores…

Finda marioneta, alteio-me por fim elevada, amor,

na grua manifesta da tua mão, no devaneio

silenciado em porão, no desejo do teu cio,

de ser proa, vela, casco…ser cais ou ser navio.

Deste promontório, olho o mar.

Alteio-me num plano dilatado, vasto e cândido,

de um céu bolinado às vagas marinhas do teu olhar.

Mel de Carvalho
Enviado por Mel de Carvalho em 29/05/2007
Código do texto: T505904
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