Eu venho do alto das Gerais e trago prendas num embornal puído

Eu venho do alto das Gerais e trago prendas num embornal puído

é matula de matuto: água de mina, rapadura, farinha e a boa nova

colhida no caminho dos campos floridos descobertos de alfenas.

De Minas trago amor, o amor que é ginga de palavra cantada

palavras de dança trançadas em terreiros antigos.

De onde venho, homens vividos fazem versos de 'lado-está-vago'

da esperança da morena distraída juízo mole do rapaz encantado.

Eu trago a lua debaixo dos pés e uma serpente na mão esquerda,

trago versos brancos e pretos, versos livres de mãos dadas.

Trago amor de Minas e canto o suspiro esquecido nas emboladas mordidas e doces quinem resto de rapadura no girau deixada.

Eu venho das Gerais, trago fumo de corda, trago incenso de mirra,

num dos bolso, dois pequenos maços de sempre-vivas debotadas.

Vaguei pelos campos desde a alfena até a vereda encharcada

onde colhi palmas de buriti na invernada para o telhado desta casa.

Esta casa de barro.que no então construí para dar pausa na caminhada

e poder escrever o que tinha vivido, o quanto tinha sofrido e o quando de sua pessoa tinha sentido a falta.

Nesta casa, feita de braços erguidos no barro das ancas do novo rio São Francisco, a janela do meu peito se abre para a prenda mais rica que é a vista do cerrado: o cerrado vivo que impressiona e muda por inteiro de forma e cor o tempo todo na nossa cara para dentro do peito.

Trago amor de Minas e não é atoa: é para te oferecer na forma de flores antigas, singelas, flores brancas e brutas, flores da inocência não colhida no jardim da nossa infância.

TTudo que coube, trouxe - o mais do retorcido é cansaço.

Venho de longe, toda gente já sabe, das minas trago amor.

Baltazar

Baltazar Gonçalves
Enviado por Baltazar Gonçalves em 21/09/2016
Reeditado em 21/12/2016
Código do texto: T5767942
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2016. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.