Como se fosse anoitecer

Se puder, algum dia, diga como me sente,

Pois vejo nos sulcos da minha pele,

Os veios antigos onde surgiram os cânions,

Lapidados pelo tempo;

Sou eu, logo que o sândalo abre suas flores,

Voo, qual perfume embalado pelo vento;

e quando toco o solo viçoso do prado,

Vou correndo pelos contornos do estrado,

O leito entre as colheitas,

com a qual o ceifador nos cobre;

E me deito sob o temido véu,

Trazendo a esperança terna da morte vindoura,

Pois, procriarei em tua alma

a conjuntura diáfana da humanidade,

Onde cai o pano, derramando-se,

em lumes de fogo vindos do céu “aleitador”,

Quando proscrito dos cumes da puberdade,

Ainda que habite em mim a divindade,

Entregue a sua própria sorte...

Quero-te flor da vida, no cheiro dos campos,

No voo alegre dos pirilampos,

Brindando sem pudor a chegada da noite,

Como se fosse anoitecer apenas,

Sem duvidar do céu onde brincam as estrelas...

E meu ser volvesse a nascer na alma,

Como um lençol branco,

Estendido ao profanado amanhecer,

Depois de lavado e torcido,

Como se, em vão, tivesse eu sofrido,

E, por fim, sido resguardado,

No embalo calmo de um rio,

A salvo no afluente macio que tu, minha doce senhora,

Tens me ofertado,

Rompendo a casca de minha terna fragilidade,

Como hímen deflorado em dor,

Entregue ao pavor da busca, no calor do afago,

Refaço-me em teu rosto repleto e acariciado,

Por um gesto pleno de amor,

E o sangue brotado tem o gosto do afeto,

Duma pétala de rosa vermelha em sacrifício,

Onde, nos lábios, centelha sua concepção,

De poder um dia, ter lutado mil batalhas por ti,

Tendo-as vencido no auge de sua glória;

E, mesmo assim não verás o quanto sofri,

Na ambiguidade de tê-la perdido a cada momento,

sob a luz imposta pela amargura,

Em que, sentado à beira do caminho,

Terei apenas exposto nosso amor ao tempo,

Voando numa longa história...

https://www.youtube.com/watch?v=CvFH_6DNRCY

“O poste que floriu”

Publicado em 17 de agosto de 2011por Amanda Paz

A natureza sempre tenta nos ensinar alguma coisa. Mas, será que aprendemos?

Por: Tônia Amanda Paz dos Santos (a autora permite cópia, desde que citadas as fontes)

O fato, relatado a seguir, não é novo. A notícia foi publicada, em 2009, em diversas mídias. Mas, como a gente normalmente se esquece de certas coisas das quais não deveríamos .

O curioso caso aconteceu em Porto Velho (Rondônia). Por incrível que pareça, uma árvore bem representativa da belíssima flora brasileira – o Ipê amarelo – teve seu tronco utilizado como poste de iluminação em uma das ruas da cidade.

Depois de aparado e colocado na rua, o tronco recebeu os fios de eletricidade. Parecia que esse seria um final indigno para uma árvore tão bonita. Mas não foi. Passado algum tempo, o tronco recomeçou a florescer. Segundo o engenheiro florestal e ambientalista carioca Glauber Pinheiro, o ideal são postes de eucalipto tratados que duram até mais que os de concreto, e ainda têm propriedades mais adequadas como poste. Árvores de eucalipto com sete anos já podem ser transformadas em poste. Já o ipê da foto tem pelo menos 15 anos.

Glauber adverte que não se deve utilizar madeira para fazer poste sem que passe por um processo de secagem. Informa ainda que se fosse uma espécie que não enraizasse a vida útil seria mínima, além de rapidamente ser atacada por organismos xilófagos (que deterioram madeira) e estabelecem colônias.

Um outro fato importante apontado pelo ambientalista é que árvores não apropriadas para fazer poste correm o risco de tombar em cima de uma casa ou automóvel, ou pior, de pessoas, e ainda levar toda fiação elétrica junto.

“A árvore deve ter sido cortada e colocada em outro lugar em pouco tempo, e aí, dependendo da espécie, ela enraíza mesmo, e brota novamente. Bem, utilizar um ipê para poste é brincadeira. É para isso que serve o eucalipto e este caso não serve como referência, mas sim como o poste brotou. O toco que ficou no lugar onde cortaram a árvore deve ter rebrotado também”, comenta Glauber.

Além disso o ambientalista enfatizou o problema que é a calçada cimentada, enforcando a base do poste, isto é, a árvore. Essa vai morrer novamente. Corre o risco também de tombar. “Tomara que abram aquele cimento em volta da árvore para que ela sobreviva, evitando o que chamamos de estrangulamento de colo”, conclui. (Jornal dos Amigos, 12/04/2009).

Por maior ou menor que seja a intervenção humana na natureza, ela nunca ficará sem uma resposta (não foi Newton quem disse que “toda ação gera uma reação”?). Às vezes essa resposta é positiva. Outras vezes, não. É como se a natureza estivesse, o tempo todo, a nos ensinar alguma coisa. Infelizmente, apesar de anos e anos de evolução; apesar de todo conhecimento acumulado e repassado através de gerações, muitos de nós ainda não somos capazes de compreender as coisas mais simples: como a insistência de um singelo tronco de ipê em nos alegrar uma vez mais com, quem sabe, sua última florada.