COMO DER, JANTAR

Estou estendendo a toalha na mesa

Enquanto arrasto a mala

Pela sala de jantar.

Ciente da nossa defesa

Vejo ali uma bengala

Que ninguém quis arriscar.

Depois de tanta poesia

Fios e traços embolados

Sinto pela estadia

E por estarmos tão cansados:

Antes mesmo da bússola

Ou do sorriso tristonho.

Sinto muito se não fui

Como seu antigo sonho.

Mas suas linhas seriam tudo

Que eu precisaria pra escrever

Se não fossem pelos traços

A nos submeter.

E o oceano no seu olho

Fácil de nos alinhar

Passou o dedo na minh'alma

E se deixou um tanto lá.

E é por isso que eu ainda posso

Pôr a mesa e uma estrela cadente

Enquanto lembramos que nada

Permanece permanente.

Eu posso deixar uma muda de roupa

Eu posso esquentar o café

Pra gente sentar, enquanto tudo nos poupa

De mais uma xícara derramada de fé.

Eu posso deixar uma roda

Emperrada no meio do vão

Pra quando quiser me contar

O que apertou o seu pulmão.

Eu posso largar mais pedaços de mim

Pelo seu sofá

Só não pode ser como quase foi

Caberemos caber nesse não será.

Então chega perto pra eu te ter de outro jeito

Porque não podemos ser tudo aquilo

Mas é você que eu quero

Pra entender os nadas.

Senta aqui pra caber no meu peito

E não finge que está tranquilo

Em só me olhar da arquibancada.

Eu quero seu violão perto

Nosso (a)braço aberto

Pra chegar a dança.

Se não pode ser assim tão certo

Que seja no entreaberto

(Greta)

Da nossa fiança.

Chega aqui mais um pouquinho

Não bate essa porta

Que eu vou nos servir.

Eu posso não poder ficar

Mas também não aceito

Ter que nos partir.

Quero ouvir sua semana

O fogo e a chuva do seu mês.

Porque sinto que se formos embora

Nem o espelho

Verá

tal

vez.

Estou estendendo a toalha na mesa

Enquanto arrasto a mala

Pela sala de jantar.

Ciente da nossa defesa

Vejo ali uma bengala

Para nos engatinhar.

Depois de tanta poesia

Fios e traços embolados

Quero mais que uma estadia

E nossos olhos enrugados.

Chega mais perto pra gente

Achar outra maneira de se apoiar…

Se nossos mundos não se encaixam

A gente pode

Via

Ja

r.

Eu quero ao menos ser seu ombro

Ser um colo, uma ponte

Uma conversa larga

No meio do bar.

Se nossa hora não é hoje

E talvez nunca seja: Conte

Ao menos com essa perna

Pra te desembolar.

Só não se perde de mim não

Que depois demora de crescer

O tanto que poderia

Bastando não nos perder.

Que o escuro no meu olho

Tão fácil de nos matar

Passou o dedo na sua alma

E espera nos clarear.

Estou estendendo a toalha na mesa

E convidando você pra entrar.

Tire minha pele, meus ossos

E, prazer,

Quero nós dois

Com o que sobrar.

Estou estendendo a toalha na mesa

E me convidando para além cheirar.

Tiro sua pele, seus ossos

E, prazer,

Quero nós dois

Como

o que

ficar.