CORPO FECHADO

Seguir em frente mesmo diante de tanto sofrimento porque acredito que o amor ainda é capaz de transformar as indiferenças em algo muito maior entre nós. As vezes paro para pensar no motivo pelo qual estamos ainda tão longe um do outro e ao mesmo tempo tão perto. Quando perto, uma sintonia sentida no cruzar de olhares e quando longe, uma sensação de frieza que faz parecermos tão distantes.

Não temos brigados, discutidos ou nos ofendidos. O que acontece entre nós são motivos guardados num segredo que palavras soltas não são capazes de contar. É preciso uma história. É preciso mais que uma história para entender. É preciso tempo para contar. É preciso uma vida inteira para ouvir. É preciso de lápis e papel para escrever o que o coração sente e a boca não é capaz de dizer com tom suave e doce das palavras.

O coração é grande e amoroso, mas o corpo é frio e fechado. A razão, o orgulho, o medo, a indiferença são partes do segredo que tu guardas. A dor que sentimos nos aproxima e nos afasta ao mesmo tempo que nos mata. Mas viver ainda é possível, muito embora seja a noite o abrigo de que precisamos para fazer sentido no emaranhado de sensações e sentimentos que dois corpos fechados necessitam para seguir e encontrar o sentido da existência.

Se alimentar um do outro. Viver um para o outro. Uma vida sombria, disfarçada e escondida para que a luz do dia não fira o peito como bala de prata. O corpo é fechado, mas o coração vive e pulsa como se vida ainda tivesse. Não importa quantos dias terei que amanhecer de olhos fechados ou quantas noites vagando no escuro a procura do alimento que me faz ser outro.

Quero a toda prova saciar-me do teu corpo e encontrar nele a morada para a eternidade e se isso não for possível, caro vampiro, vou me despir dos mais genuínos sentimentos, chorar uma brevidade suficiente pela despedida, ter a coragem de olhar no espelho e me ver sem as cicatrizes que me causastes, seguir adiante como se nada tivesse ficado para traz, para que penses que desisti de procurar o que escondes de tão cruel que me faz sofrer.

Antes que isso possa acontecer vou pedir mais uma vez. Deixe de lado teu segredo e venha sem medo ocupar o espaço que é teu neste mundo que de tão sombrio me aguça a vontade de te explorar e te fazer sentir novamente o calor penetrante que nem mesmo um corpo fechado é capaz de repulsar.

Se insistires nesta dicotomia que me deixa ora na luz, ora nas trevas, vagarei na noite preta, não importando quanto vermelho seja o alimento de que procuras, porque quero impiedosamente adentrar na escuridão de tua alma e arrancar o segredo do vampiro que habita em mim.

Paulo Roberto Fernandes
Enviado por Paulo Roberto Fernandes em 24/10/2018
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