Retrato

Esta noite reflete minha frieza interior

Mariposas rodopiam sem encontrar quentura

Violas não entoam seu som de amor

A brisa da noite castiga na frescura.

Nos bancos mendigos adormecem

Cansados por fome e busca de alimento

Os bêbados tropeçam na rua deserta

Mulheres vendem o corpo sem sentimento

Ouço o gemidos dos doentes aflitos

Cheiro de corpos moribundos invade o ar

As crianças deitadas no chão frio e sujo

Torna-se uma triste paisagem a contemplar

A dama da noite não desabrochou

Por ter visto uma nuvem esconder a lua

Tristeza e lamento no canto do sonhador

Contaminado pela dor que via na rua

A bebida e a fumaça exalavam o torpor

Dos dependentes de carinhos na solidão

Foram seres normais transmutados na dor

De terem-se perdido numa grande paixão

A noite está indo e o dia amanhece

A descrença toma conta da alma

O corpo cansado também adoece

Nem percebe a manhã que vem calma

A vida está sem brilho e sem cor

Ofuscada pela névoa sentida

Um simples retrato preto e branco

Colocado numa moldura partida

Lágrimas rolam caladas no peito

O olhar perdido sem esperança

Colorindo por vezes a outra imagem

Que perpetua na minha lembrança

Beth Nunes
Enviado por Beth Nunes em 21/09/2007
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