Aurora da Vida

Ao curvar-se para ajudar a dança desnuda dos alvoreceres, certa vez,

No céu imóvel apareceu com elevada quietação em forma de espectro

Cuja sensualidade ao fulgor irrompia como escarcéus uma mulher

De onde afetuoso alimento desconhecido em seus seios se podiam ver.

Como era esplendida mulher! Embora pecadora – porém era esplendia!

Qual flor se abrindo, qual cisne ou linda canção de amor.

Trazia a alegria dos oceanos e um olhar que desaparecia no alvorecer.

Tinha madeixa brilhosa qual uma cascata, qual lua cheia ao anoitecer.

Sua voz macia trazia o irresistível amor

Em forma de canção noturna um acorde, longe muito longe.

Uma renúncia vaga declinado de corpo em repouso em afetividade.

Uma nau em charme evadindo ou garça dispersando-se.

Constituímos nela, permutamos nela e a incluímos em nossas vidas.

A bruma evadia albores nos rigorosos climas

Ela ainda nos transportava em seus braços, era o que importava.

Se seu alimento – leite materno - sobre nós jorrava e no céu?

Como parasitas estranhas ela nos abrigou, seu corpo despido.

No ventre a fecundamos, amamos e a defendemos.

Sobre seus seios apoiados no brilho dos temporais adormecíamos.

E ainda para melhor compreendê-la queríamos nos tornar astros.

A apavorante ilusão caiu sobre as nossas almas no calmo crepúsculo

Gelada e silente ficava a amada, enquanto o brilho fugia do seu olhar.

Corria do seu peito o leite materno gelado ao nosso amor desfalecido.

Alçou voo, muito alto além do previsto, preso no interior do espaço.

Choramos por longo período e nossos choros o solo alagaram

Mas antes a visão dolorosa da beleza morre toda dor.

Diante do vulto do alvorecer prevíamos a paz e a queríamos.

E na grande turnê a calma abertura nós antevíamos.

Quando, porém, no ar dormente nossas assas vibraram.

À nebulosa prisão do leite nos sentimos ao invadir nossas condições

Enquanto sob a pureza um rio de paixão corria – via Láctea.

Da amada que um dia faleceu a linfa dos peitos.

Malvado aquele que bebeu o leite dos seios da virgem que era amante

Mau na contemplação da demora do sexo intranquilo e acrimonioso

Que beijou os lábios análogos à ferida sangrenta.

Ali ficamos, de asas soltas e inquietas do misterioso plasma escravos.

Meio anjo, meio diabo, eufóricos ao vento à remota masmorra.

Deitados sobre o solo, exibindo a admirável essência da vida.

Flores das campas agora turvos surgido da face pálida da extinção.

R J Cardoso
Enviado por R J Cardoso em 23/07/2019
Reeditado em 23/07/2019
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