MENINO DO RIO

Menino, onde vai soltar pipa esta manhã.

Na pista perigosa ou nos campos verdejantes?

Está tão próximo que não te vejo menino,

Ouço apenas o vento ponteando tua linha...

Vai saltitante menino aguçar o sossego da garotada.

Se nada ouvires da mamãe, siga!

Se ouvires o tilintar de Deus, pare!

Se ouvires a voz do lúcifer, volta menino!

Traz uma rosa vermelha para dona Maria,

Vá com Deus! Daqui a pouco a pipa sobe

Toma cuidado com o carro e rede elétrica!

E com o motoqueiro, que passa feito vento!

Por que vai sozinho, que fizeste da tua alegria?

Fizeste do vagabundo um homem?

Me falaram, que ele era ruim, menino

Dizem que não foi difícil mudá-lo...

Menino, tu és homem, filho do Rio!

Cidade Maravilhosa, eu amo de montão!

De gente linda, que transmite felicidade

Onde está os mistérios dessa cidade menino?

Do planeta nada quero; apenas a alegria do céu

A felicidade sorri antes de o sol nascer...

Oh vai ao céu menino, tua pipa está indo rápido.

E quando a felicidade vier, a segure para mim.

Ah, que tua pipa é leve menino, sabe a brisa.

Ela até me pensamento vagando ao léu

Tão alto o céu que eu adormeci olhando-o.

E ele distante nem sentiu minha presença, menino.

Tu és importante, abelha não te pica.

Gato não te arranha, onça não te pega.

Ficas hora andando na mata,

E quando vem não tens caça nas mãos!

É fato que viste duende no fundo do mata?

É que ele atravessou a onda do vento, e sumiu...

Ah, que tua vida tem história, tem história.

Tu enxergas de noite menino, tu sabes o nome do grão de areia?

Por que ficas o tempo todo olhando o mar sem embarcação?

Quando eu olho o mar fico atordoado de tanto pescador.

E vejo moças peladas que vem vindo menino.

Tu já se deparaste com moça pelada, um dia eu me deparei,

Com uma moça pelada no dourado do sol.

Tinha uma estrela no peito e uma alegria na volúpia.

Boca seca e pernas unidas numa manta negra, menino.

Não acha que a fêmea parece com o beija-flor?

Que as pomas dela parecem forquilha de ponta-cabeça?

Que a pança dela parece saco de gelatina tremulando?

Que a volúpia dela parece ostra semiaberta menino?

Esquece o meu clamor menino que eu jamais fui imaculado!

Tua pipa rasga o espaço com oscilação de carinho

Ah menino, essas rabiolas são cabelos de mulheres no espaço.

Vai sem pressa menino, que a brisa te acaricia...

És tu que bebes a água ‘inda gelada trazida de casa?

Ou é o suor de teu corpo voando no vento calmo?

Minha vontade era segurar a linha de tua pipa.

Trazer a lua prateada um pedacinho do céu menino!

Ah menino, que maravilha tua pipa!

Quando empinas tua pipa, empinas também teu espírito!

Tua linha é navalha irresistível para a linha do outro.

Tua manobra é mesmo firme, nas ondas do vento!

Toma suco de laranja e refrigerante açucarado.

O sonho de soltar pipa te defrauda o apetite menino

Toma um sanduíche para a tua força, toma menino.

Senão ficas fraco que nem teu pai Zé da Pipa, menino...

Se estás infeliz eu vou procurar Zé Ninguém, o poeta nordestino,

que lê para você verso que fala em uma só estrofe de todo o nordeste.

Na derradeira vez ele para e chora, menino. é divertido

E tira o chapéu, entra na asa delta e vai até perto do céu.

Não fiques tu infeliz, menino, que amargura não leva a pipa ao céu.

Deixa a amargura para o Alcebides, que é milico e brigou com a namorada.

Que pegou batata quente só para não se lembrar da dor da ingratidão.

E fez tatuagem no peito, com a serpente que tem o nome da moça menino.

Tua cidade Rio de Janeiro é misteriosa, cuja paisagem parece oração.

O olhar é mais bonito que o momento do por do Sol.

Um dia, enfastiada de tristeza, ela vai se estender na paisagem.

Vai por as mãos na alma, vai abraçar os restos e se acalmar.

Deus te proteja, Deus te proteja voando nessa vida...

Ah menino, tu soltas a pipa da liberdade.

Mas toma cuidado, que de tanto soltares a pipa,

Um dia a vida também te faça voar menino!

Tens um brilho aceso nos teus cabelos, menino.

É o sol? Oh, tire-me da noite, menino!

Quero clarear meu espírito na tua luz!

Meu espírito sombrio, na escuridão dos astros.

Ainda não se vá, ouça! Eu te ofereço o escapulário.

Eu te ofereço o patuá. Eu te ofereço a pipa sagrada.

Quando Vênus se for não quero me sentir sozinho.

Não quero sentir-me sem visão ...

Ouve o hino misterioso dos anjos no céu.

É o fim menino, o indizível fim.

A noite já vem em penumbra em negritude...

Vai, vai menino, filho do Deus, irmão da liberdade.

És tão lindo, que nem sei se tu existes mesmo, menino.

És o amor com que eleva o desejo de liberdade!

Só te vejo, no dia que se transforma em noite, felucidade!

Vais acompanhando tranquilo vento.

Levas na mão, a bandeira da paz tão sonhada.

E puxa com a linha a pipa na face implícita de Deus.

R J Cardoso
Enviado por R J Cardoso em 29/07/2019
Reeditado em 29/07/2019
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