O amor entre a hera e a pedra

Vislumbro-te num espelho como numa chegada a um bosque de faias na Alemanha. Te encantas com o cheiro amadeirado que sobe pela relva e observas atentamente a hera que avança sobre o muro de pedras. Ficas atônito ao perceber o quanto de amor se revela naquele arbusto que ferozmente domina a pedra e por ela nutre o desejo de seguirem juntas abraçadas vida afora. Sentes em tua pele macia o ardor da simbiose que exala do amor entre a hera e pedra. Ficas a olhar os caminhos deixados pelas raizes que se foram na estiagem do último verão, restos de folhas secas, raizes mortas pelo calor e pela escassez da chuvas de verão. Teu olhar vai a imensidão e as profundezas do amor. Ficas ali estático a pensar como pode um arbusto sarmentoso de ramagem pequena se apaixonar por um muro seco e sem vida? A pedra parece não se importar com os caminhos tortuosos escolhidos pelas gavinhas que riscam com graça a aridez de suas formas. Por que razões as ramas com seus fios delicados e finos desejam tanto se afixar naquela porosa pedra? Sabes que a mágica do amor está ali presente. Pedra e hera se alimentam a muitos anos num balanço harmonioso da natureza e isso te faz completamente feliz. Percebes que a esfinge que ali se forma, de raizes e folhas que contornam o coração da pedra, só estão ali pelo desejo de ambas. Assim como no amor, ambas fecundam em sua fertilidade, onde há oferta de calor há também oferta de agua sob medida. Te encantas ao perceber as sutilezas que essa relação apresenta. Até escutas os poemas e canções trocados entre a gélida pedra e os coloridos arbustos que se enredam na busca de buracos porosos. Haveria para a hera uma vida longe da pedra? Vice versa? Teu coração dispara ao imaginar a solidão de ambas que se desejam ao serem arrancadas daquilo que mais almejam. Sem passado, sem futuro. Agora entendes que o amor é indivisivel em suas incompreensões. Que a ele cabe os sentidos da vida como uma trepadeira agarradinha que sonha, um dia, em ter sua pedra.

Intato Albano
Enviado por Intato Albano em 14/02/2020
Reeditado em 14/02/2020
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