Translado

Papai encavava, amolava a enxada ou a foice,

A apoiava em um dos ombros

E de pé no chão ia para o roçado.

Mamãe cozinhava para nós, para os porcos

E cachorros, depois ia para o Tear.

Era pedra para frente, pedra para traz

Da esteira de taboa ou junco que tecia;

Pedra sustentada por corda de algarve

A esteira costurava, cujo peso suportava,

Mas doía quando uma das pedras em sua mão tocava.

Em tempo de enchentes meu irmão mais velho

Ia para lagoa pegar peixe com peneira ou anzol

Eu sozinho ficava ouvindo o cantar da seriema

Nas pastagens, no cerrado e capoeira preservadas

Não lia, nada tinha para ler, nem mesmo histórias tristes,

Como não tinha histórias para ler o pensamento

Comigo vagueava por entre bananeiras e laranjais

Uma voz surgia e tentava acordar Casa Grande

Para “Libertas que Será Tamen” aos negros das senzalas casas e casebres.

Tecendo mamãe parava e da janela me olhava

Menino! Venha cá! E ordenava:

- Ponha o tamborete próximo ao fogão

Suba e pegue a linguiça seca da fumaça.

E espreguiçava... Se esticava toda!

No roçado meu pai continuava a trabalhar

No gigantesco cafezal nos alqueires do patão.

E eu não sabia que eu seria vencedor

E poderia escrever poesia ou poemas

Para ninar gente grande falando de amor.