Mar de Sepetiba

Aos olhos de Maria Leopoldina era lindo o entardecer, diria meu talvez tataravô, meus ancestrais, que sem nada dizer por gesto se expressavam — liberdade, liberdade que era seu lema, seu querer sobre a areia molhada pelas ondas que fizeram para sempre meu viver, eu via horas a fio o acalanto da sua alma na gralha em revoada em volta do grande ipê.

Amigos eu tinha apenas pescadores ainda por conhecer, portas abertas em casas desertas humilde saber, tarde linda a espera de novo amanhecer de alegria, com eles aprendia a cortar lenha e ir pegar conchas sonoras no mar profundo da Bhaia de Sepetiba apenas por prazer que trazia a doce emoção do lugar, os ensinei a namorar moças e rapazes bonitos de sorriso maravilhoso, ao conquistar. Eu escrevia e os mostrava minhas poesias — eles não sabiam ler nem escrever, era prazeroso roubar frutas cítricas nos pomares vizinhos cujos cães nos amedrontavam. Um dia eu li a história de Robinson Crusoé e a "Terra dos Meninos Pelados”. E deles recebi a atenção e amor que nunca tivera, presente de coração, diziam-me.

Lembro hoje das ondas da Bahia de Sepetiba batendo nas rochas calcarias nas noites escuras e as vezes de lua cheia, não deu para esquecer ninguém, nem da falta de socorro as catadoras de mariscos e dos quilombolas do lugar por quem de direito teriam de ser lembrados, como esquecer desse povo, dessa brava gente? Se ele é a essência da vida e do novo que as vezes não se espera. Havia sofrimento, mas a noite no mar inquieto todos cuidavam de mim, não estive tão só porque os amigos acenderam a luz da esperança nesse espera sem fim, o murmurar das águas turvas nunca me esqueço, o mar continua ali, os barcos e as traineiras se foram e todos os pescadores mesmo carentes de subsídios nunca desistiram, nunca esqueceram de mim nessa aurora que nos faz rejuvenescer e seguir.