Antologia Poética a Augusto dos Anjos

Falas de amor, e eu ouço tudo e calo!

O amor da humanidade é uma mentira.

É. É por isso que na minha lira

De amores fúteis pouco falo.

A antítese do novo e do obsoleto,

O Amor e a Paz, o Ódio e a Carnificina,

O que o homem ama e o que o homem abomina,

Tudo convém para o homem ser completo.

Junta-se um hemisfério a outro hemisfério,

Às alegrias juntam-se as tristezas,

E o carpinteiro que fabrica as mesas

Faz também os caixões do cemitério!

O homem por sobre quem caiu a praga

Da tristeza do mundo, o homem é triste

Para todos os séculos que existe

E nunca mais o seu pesar se apaga!

Não crê em nada, pois não há nada que traga

Consolo a sua mágoa, a que só ele assiste.

Quer resistir, e quanto mias resiste

Mais se lhe aumenta e se lhe afunda a chaga.

Pois é possível que Eu, causa do mundo,

Quanto mais em mim mesma me aprofundo,

menos interiormente me conheço?!

O mundo é um sepulcro de tristeza,

Ali, por entre matas de ciprestes,

Foge a justiça e geme a natureza.

Não, não quero meu sonho sepultado

No cemitério da desilusão.

Que não se enterra assim sem compaixão,

Os escombros malditos de um passado.

Por que choras tristonho lírio,

Se eu sou o carvalho eterno que te chora,

Para que pendes o cálice que enflora

Teu seio branco do palor do círio?!

A praça estava cheia. O condenado

Transpunha nobremente o cadafalso,

puro de crime, isento de pecado,

vítima augusta de indelével falso.

Bendito seja o amor que infiltra na alma o enleio

E santifica a existência o cardo,

_ Amor que é mirra e que é sagrado nardo,

Turificando a languidez dum seio.

O amor, porém, que seja da Desgraça veio

Maldito seja, seja como o fardo

Desta descrença funeral em que ardo

E com que o fogo da paixão ateio!

_E tu velas, a sós, no pó da fulgurância,

Como uma velha cruz vela na sombra morta!

Fora, a noite é tumbal... E a saudade da infância,

Como uma alma de mãe, acalenta-me e conforta!

O Riso, o voltairesco palhaço, quem mede-o?

_ Ele, que ao frio alvor da mágoa humana,

Na Via - Láctea do Nirvana,

Alenta a vida que tombou de tédio!

E bebi! Mas sei por que bebi!... Buscava,

Em vedes nuanças de miragem, ver

Se esta ânsia suprema de beber

Achava a glória que ninguém achava!

E todo dia então me embriagava,

_Novo Sileno,_ em busca de ascender

A essa babel fictícia do prazer

Que procuravam e que eu procurava.

Sei que durante toda a travessia

Da minha infância, vivia,

Assim como uma casa abandonada.

Vinte e quatro anos em vinte quatro horas...

Sei que na infância nunca tive auroras,

E afora isso, eu já não sei mais nada!

P.S: Espere por mim Augusto, magnífico anjo poético.

Gilliard Alves

Gilliard Alves
Enviado por Gilliard Alves em 29/04/2010
Código do texto: T2226920
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