A Santa Sampa

Hoje, a garoa de antes
voltou a molhar os reflexos
que vejo nas escuras noites cruas.

Talvez, aquele seja o bar
e, aquela, a cena de sangue
que Vanzolini, uma noite viu
e noutra cantou.

Mais um pouco, no próximo quarteirão,
ficava o aparelho onde primeiro caí.
Dali, também, Beth se foi.

Pouco além, imponente, mas quase
pedindo desculpas pela própria imponência,
ouço a Quinta de Mahler que abafa
os gritos torturados que ainda vagam
pelas sórdidas paredes do antigo Palácio do Mal.
Foi ali, hóspede esperado da "Cadeira do Dragão",
que soube da realidade dos homens
e que o Diabo existe. E que não morre.

Talvez, Glauber, a Terra seja apenas dele.

Tantas coisas no coração, Caetano,
entre a Ipiranga com a São João!

Tantas coisa havia, Beth.

Tanto andei, Deus dos ateus,
mas ainda te sinto, Santa Sampa, envolver-me
com suas negras garras e sujos grafites
nos muros escorados pelas putas da Luz.

Tantas...

Mas, depois, foi o tempo de ir embora.
De tentar esquecer. De tentar vencer.
De fazer outra vida
e, depois, outra vida fazer.
E tudo passou e tudo mudou.
Mas, tu, Santa Sampa, cresceu ainda mais.
E, ainda menor, fiquei.

Os outros se multiplicaram
e já nem sei quem são.
O frio acabou, o encanto quebrou
e o grito secou.
E a utopia, Carlos, não veio.

 
Homenagem pouca à cidade de São Paulo pelos 462 anos de grandiosidade e aos amigos e amigas da doce metrópole

Das poéticas de Paulo Vanzolini, Glauber Rocha, Caetano Veloso e Carlos Drumonnd de Andrade.


Produção e divulgação de Vera L. M. Teragosa.