A Doméstica

DOMÉSTICA
Miguel Carqueija


Eu trabalho em residência
como empregada do lar;
tenho muita consciência
de como assim trabalhar.

E varro, passo e cozinho
e limpo bem este chão;
faço almoço gostosinho,
ponho a colcha no colchão.

Dou comida ao cachorrinho,
pego a criança na escola;
ponho em tudo o meu carinho,
nem por isso sou gabola.

É porque eu sou responsável
mesmo ganhando pouquinho,
pois com todos sou amável
e ganho o meu dinheirinho

que dá sustento ao meu lar,
é muito o pouco com Deus;
pra mim a vida é amar
com os entes queridos meus.

Todo mundo compreenda
que a doméstica é gente;
que todo patrão entenda,
pois é nobre e competente

quem dá suporte à família
a todos aliviando,
estuda e trabalha a filha,
a mãe dá aulas pensando

que a casa está em boa mão!
Por isso vou me esforçando
pondo nisso o coração
e passo o dia cantando!



O que eu nunca vou fazer
é perder tempo no smart
pra abusada parecer,
ser despedida destarte!

Não perco tempo em fofoca
nem vejo televisão;
nem fico tomando Coca,
trabalho com devoção.

E não pense que é moleza
trabalhar neste verão,
já cedo vir com presteza,
suando na condução!

Acordar de madrugada,
porque o trabalho é distante;
muito chão até a chegada,
e já chegar ofegante!

Mas o meu dever cumprido
já é uma recompensa;
e se o dia é comprido
no final tudo compensa!

E quando eu me aposentar
me lembrarei com ternura
da menina a me beijar,
dos momentos de ventura!

Das amizades que fiz
por saber me comportar,
onde meter o nariz
sem jamais extrapolar!

Ser da família um apoio
sem jamais esmorecer,
ser o trigo e não o joio
dá alegria ao viver!


30.1.2017



                
               AVÓ CLANDESTINA

                                   
                    Jaque Reiss



 
—Tome, pegue aqui!
—Obrigada Dona Maura, não precisa se preocupar!
—Ora essa, pegue aqui!
Carinhosamente, então, eu pegava o pedaço de maçã que Dona Maura oferecia, partido por ela, com somente uma das mãos.
Gestos tão nobres como este estão cada vez mais escassos diante dos nossos olhos. Maestria em humildade. Semelhante a uma lady, aclamada pelo povo. Acena dentro de mim a saudade.
 
Grandes são os vínculos que criamos nos locais em que trabalhamos. Deus agraciou-me com uma família postiça, que tinham parentes e amigos, estes, que peguei emprestado até os dias de hoje. Clarice Lispector falara de “Felicidade Clandestina”, e, rememorando a mesma, agradeço a Deus pelas clandestinidades aparecidas em minha vida, diante de um histórico familiar disfuncional o qual tive. A palavra que soa, no túnel do tempo é gratidão. Deus desenhou os caminhos. Preparou boas vindas, lutas e aprendizados com as pessoas certas. Todo mundo deveria tirar um tempo, para ouvir quem já viveu mais. Ser cuidador de idosos ou simplesmente um trabalhador doméstico é simplesmente repetir o que se faz no seu próprio lar, com o mesmo cuidado e amor a qual dedica aos seus familiares e amigos.. Deve-se respeitar e valorizar a privacidade cedida, a confiança e respeito dados.
 
 
Jaque Reis é escritora (contista, cronista) residente em Franca-SP, e possui escrivaninha no Recanto das Letras.


 imagens clickgratis e pinterest; fotografia de Jaque Reiss gentilmente cedida pela autora.

 
Miguel Carqueija e Jaque Reiss
Enviado por Miguel Carqueija em 04/10/2017
Reeditado em 05/10/2017
Código do texto: T6133153
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