Rugas do tempo
Ao longe se escutava o cantar do galo
Estava alvorecendo o dia 19 de junho de 1984
Com os olhos fixos no teto, deitado...
Mãos por debaixo da cabeça, estava eu, sério e pensativo,
Quando minha filha, num tom de espanto pergunta:
Papai, o que é isso atrás do seu bigode?
E eu preocupado, levo a mão ao bigode à procura do que ela vira,
E então começo a rir, vendo o seu semblante ávido por uma resposta.
E então eu fico sério, pois a resposta não é nada agradável
Pois o que minha filha notara por trás do meu bigode
Fora os sulcos do tempo, as rugas da minha velhice.
Com as pontas dos dedos, acariciando o siso por ela desenhado
Digo para minha filha, são as rugas do tempo meu amor.
E ela conformada pela resposta se aconchega e perto de mim cerra os olhos...
Não longe de mim, mas num ponto qualquer de minha sala
Meu olhar e minhas perguntas vagas se encontram...
Tudo é tão branco, mas porque, porque cheguei as rugas tão cedo?
E novamente de mim tomam minha atenção;
Pois do lado, com uma tremenda algazarra
Prende-me num olhar constante, de brilho angelical, a minha caçulinha;
E eu, mais uma vez deixo de ser sério e esboço um sorriso de satisfação
E como se de mim saísse uma resposta para tudo, respiro com profundidade...
Lá dentro do meu espírito, e jogando pra fora todos os ressentimentos passados
Contente e sorrindo, percebo a importância das minhas rugas.
Às minhas duas filhinhas: Aline e Tais, com muito amor e carinho.
Vicente Freire – 19/06/1984.