Como não mais viver, sem precisar morrer?

Aprecio demais a vida e toda sua majestosidade.

Valorizo cada nova manhã cinzenta e congelada.

Admiro a natureza e todo seu fulgor vital.

Mas sou inutilizável e sem cor.

Não é tristeza, não é dor.

Não. Porque tudo está indo bem demais.

É apenas um gancho gelado na boca do estômago.

Puxando na direção do não-real.

Me passe uma dose de sono eterno.

Não é a vida o que eu quero deixar.

É uma viagem só de ida.

Onde jamais poderei voltar.

Como não mais viver, sem precisar morrer?

O que posso fazer para continuar?

Me sinto sem sentidos.

Sem escolhas.

Sem direção.

Aprecio o vento, mas não sinto minha pele.

Aprecio o som das ondas, mas não ouço meu coração palpitar.

Aprecio cada novo raio de sol, mas não enxergo o que há do outro lado do espelho.

Não o entendo, não o decifro.

Tão enigmático e sombrio.

Sua alma vai se desfragmentar.

Um vazio devastador, uma overdose de solidão.

E uma vontade imensa.

Não de gritar.

Mas de fechar os olhos na sombra mais profunda.

E adormecer para nunca mais acordar.

Deixe-me sonhar adoecido, deixe a última lembrança se esgotar.

Até que o canto dos pássaros, no jardim do Éden perdido.

Venham com a chuva me ressucitar.

Como não mais viver, sem precisar morrer?

Acho que não há uma maneira de se realizar.

Porque vivo eu nunca estive.

E morto nunca vou estar.

Para todas as almas que vagam por esse mundo.

Glaucio Viana
Enviado por Glaucio Viana em 01/06/2009
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