o gavião e o graveto

de lá de cima do céu

com os seus olhos possantes

flagrantemente injetados

com o sémem da incompreensão,

inconformidade ou ódio

por ter saído do pódio

ou nunca ter estado por lá,

o gavião se detinha

na cobra querendo passar

languidamente, mas firme

sobre o graveto abusado

que ia ficando esquecido

a cobra não era o problema

sempre esteve ao seu alcance

como estamos ao alcance

das garras de alguma maldade

ao menos uma vez na vida

graveto é que destoava

porque, sendo tão desprezível,

tinha uma voz atrevida

que fora por muitos ouvida

ou talvez por alguns

o que incomodou o gavião

até o mar imenso

no seu falar silencioso

que embebeda e encanta

fez os seus comentários

do que o graveto dizia

mostrando a sabedoria

que contagia, mas pune

a quem dentro de si reúne

todas as forças da ira

por ter se encantado com a lira

que nunca lhe pertenceu

graveto na beira da estrada

sozinho vendo o trem passar

(a cobra escapara assustada,

metendo-se por dentro do mato)

e era o 85

que alguém chamou de “trem bão, sô”

e o Achilles se deliciava

enquanto tomava o café

de ter feito tudo aquilo

que sempre agrada à mulher

Rio, 30/11/2006