VELHO PESSEGUEIRO

VELHO PESSEGUEIRO

AYRES KOERIG

Não sei como foste parar perto da parede da casa da minha avó, naquele jardim aonde minha mãe cultivava suas flores (rosas, jasmins, camélias, gérberas, amores-perfeitos) e outras tantas, que a dona Aninha (minha mãe) cuidava com grande maestria e carinho.

A casa em que nasci, situada na Rua das Olarias (hoje Capitão Augusto Vidal), ao se adentrar, ficava envolta pelo lado esquerdo por uma chácara de árvores frutíferas: laranjeiras, anonáceas, caquizeiros, limeiras e outras. Destas limeiras, possuíamos duas espécies: a comum e a outra que chamávamos de lima de umbigo, que desapareceu do nosso pomar e mesmo nunca mais a vi em outros lugares. A Enciclopédia Brasileira Mérito dá alguns detalhes sobre esta fruta.

Mas, voltemos à casa da Rua das Olarias. No lado direito, ficava o referido jardim mencionado acima e nele o pessegueiro, única árvore frutífera ali. Talvez germinado por um caroço que algum de nós houvesse jogado fora depois de ter saboreado um pêssego: nasceu, cresceu, tornou-se adulto, envelheceu... Durante toda a sua vida, jamais se carregou de frutos; poucos mesmo em cada ano (deliciosíssimos). Quando sentiu-se velho, não posso precisar bem qual época, encheu-se de flores que se tornaram em frutos admiráveis, grandes e deliciosos... Daí para frente foi murchando e no mesmo ano morreu.

O velho pessegueiro quis que ficássemos com alguma lembrança dele...

Análoga também foi minha vida em se tratando de produção literária. Na minha mocidade pouco escrevi. Agora depois de velho estou fazendo, para que após a minha partida, minha esposa, meus filhos, meus familiares, meus amigos e vocês, enfim, todos de mim se lembrem como me lembro hoje do

VELHO PESSEGUEIRO

Encostado a parede ali vivias,

Com uma florescência bem pequena...

Passavam noites e chegavam dias,

E tua vida por demais serena.

Não se olhava pra ti, mas tu nos vias,

Como os “Triunfos da Alma” de Falena... *

Impregnado de muitas poesias,

No meio às flores entre as quais: verbena.

E assim ficavas junto a nós vivendo

A tua sina, como nós também...

Estas ditosas cenas que estou vendo

E com tanta clareza a mim me vêm,

Já fazem parte do meu referendo:

E recordar-las-ei no eterno além!

* Dramaturgo italiano

Ayres Koerig
Enviado por Ayres Koerig em 22/06/2011
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