saudade enorme

saudade grande

estufa o peito sem oxigênio

a guardar lembranças, flores dentro de livros,

fitas dentro de bolsas,

um pequeno guizo do gato que já morreu

saudade grande

gigante malvado, a pisar por dentro

forte e compassadamente

e a cada passo seu, uma ruína se abre na memória

o cheiro das frutas da infância,

o primeiro dia de chuva engraçado e, não triste

a primeira professora,

a carteira onde desajeitadamente sentei-me

e, com ânsia fincava minhas esperanças

naquele lápis negro.

saudade grande

dos amigos que partiram sem dizer adeus,

da família que deveria ter,

mas nem tenho

das flores que recebi em bouquets

e, não nas primaveras da vida

saudade grande

alucinante,

entorpecente

a tirar-me do foco presente,

a tropeçar em reminiscências contidas no debrun

de uma jaqueta velha,

um botão perdido,

um anel partido,

um sapato furado.

Um meia mesclada e manchada

que esconde hoje ,

a beleza que havia.

saudade de teus olhos azuis

da tua fisionomia de mármore carrara

de tua inflexão cerimoniosa

em dizer bom dia

e depois de partir

nem às mãos concedeste o direito

a um breve aceno

esquecido foi o lenço de bordado inglês

com sua inicial bordada

e a lembrança borrada da sua rejeição

saudade grande

meu corpo entorpece

minha mão trêmula

aperta o vestígio do passado

e num toque mágico

me liberta da culpa

de desejar o impossível

voltar ao tempo ido,

e não lhe perder

voltar o tempo

e não sucumbir ao abismo

voltar ao tempo

feliz das primaveras e outonos

onde o barulho das folhas secas

só nos lembrava as frutas maduras

à espera de serem colhidas.

voltar ao tempo para

me resgatar da saudade

que me engole.

GiseleLeite
Enviado por GiseleLeite em 07/05/2007
Reeditado em 19/02/2009
Código do texto: T478197
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