VARAIS DO TEMPO

Vou de mãos vazias, mas caminho duro

Quando em vez, olho pra traz

Tenho orgulho de minhas indigências

Do caco que o tempo permite à memória

Vejo o bonito jardim de minha vó

Feito numa velha banheira

Minha primeira lição de natureza

A goiabeira no centro do quintal

Não era só uma árvore

Era uma personalidade

Ela nos ensinava que quem espera

Não sofre de abandono

No porão havia um território de descoberta

Onde aprendi a criar intimidades com o vazio

Ali entendi que o escuro é um colo

E não carece ter medo

Minha mãe estendendo roupa no varal

Era, no mundo, minha melhor metafísica

Os bambus que davam altura às cordas

Rasgavam o ventre dos sonhos

O quintal era um engolidor de fronteiras

Nele o tempo tinha outras carências

O tempo só queria petiscar o dia

Não havia a tirania de um compromisso

A infância é um casa vazia na lembrança