A sombra mortífera de um amor distante

No silêncio teu corpo escorre sem forma tangível.

Teu molde etéreo, tão incorpóreo, flagela o sossego em uma deformidade escura e pastosa.

Tu és a sombra do meu miocárdio.

E no escuro dissemina teu corpo pelo cômodo,

Mesclando-se a ele, suave e impenetrável.

Teu amor é a anatomia de tudo,

Das sombras que me apagam no hálito noturno.

Tua forma intocável abraça os espaços que abrigam meus olhos.

Na pulsação das estrelas,

fito o brilho do passado entrelaçado.

Sinto minhas paredes acelerarem.

Tu aqui não estás,

Mas tua falta de forma materializa-se nos canteiros que cercam-me.

O vácuo espacial da saudade possui uma estranha deformidade

que espalha-se e enrola-se no tempo.

Sou ocupada como um cômodo vazio

Uma engenharia espasmódica,

que tremula com a presença involuntária de um ser distante,

Tu mesmo, a criatura que vaga sem tua sombra, pois ela é meu anoitecer.

É rastro dos teus movimentos fossilizados em minhas memórias.

O belo e imperturbável escuro desponta a presença do ausente, trazendo pedaços teus.

O eclipse encobre o cômodo funesto em forma de crânio.

Meu cérebro é tomado pela beleza da noite plácida.

O amor transmorfo ocupa os sentidos, como os móveis da alma.

Fui eu que roubei a sombra de alguém;

fiquei com o molde de um corpo que vive distante do meu, e mesmo assim, anoitece sobre todos os corpos da terra.

Letícia Sales
Enviado por Letícia Sales em 04/08/2020
Reeditado em 12/02/2022
Código do texto: T7026046
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