TROCA

Onde foi que viu meu rosto lindo?

No espelho petrificado pelo tempo

ou no retrato hirto

que deixei preso

à galeria de meu passado?

Viste-o com olhos?

Com olhos também lindos?

Eram tempos em que

eu os tinha ainda,

rosto e olhos, airosos

e não os escondia.

Eram lindos,

eram longínquos...

Não os tenho mais.

Perdi-os para a tristeza,

essa senhora tinhosa

e mais velha do que a verdade,

que os iludiu e os levou embora

sem a minha permissão.

Sem piedade.

Deixou em seus lugares

uma distância instransponível,

uma deformação sem alcances

e uma criança que jamais fui capaz de recuperar.

Foi bom,

porque assim pude, ao menos,

afastá-la de mim,

para sempre.

Hoje não tenho mais olhos lindos,

no rosto que também foi lindo um dia.

Hoje os tenho livres,

límpidos e venturosos.