Onze e meia em Cronos

Lá se vai o pretenso sábio

Tal qual o espectro morto

Envolvido em cinqüenta metros de pano

Tecido negro, como seu inventário torto.

Nem ao se vestir de malha de prata

Reluzente à luz do sol

Nem ao se exibir a construída e exata

Precisão do seu cabedal em rol,

Encontra paz, o pretenso sábio.

Agruras da vida o caçaram

Dificuldades que só ele enxerga

O seu sucesso não o satisfez

Não importa o que um dia fez

Nega-se ele ao prazer da entrega

Só o fluir etílico anestesia

É a pretensa vida que se (in)completa

Aos verdadeiros sábios copia

Aos verdadeiros idiotas simula

Para a morte, uma estrada reta

Pela vida, uma estrada dura.

Lá se vai o pretenso humilde

Cheio de si em só descrição

Esconde o orgulho em um copo

Uma dose de mágoa, duas de ilusão

Aparece em todas as portas

Senta-se em todas as mesas

Conhece todas as línguas,

Dono de todas certezas.

Quando lembra na caverna à noite,

Qual morcego em seu recôndito úmido

Da infância que foi seu açoite

Dos momentos de abuso pútrido

E das desventuras que se seguiram

Cada vez mais azeda um esgar.

Rir do mundo e dele fazer pouco

Estar aliado aos pessimistas

Abandonar a luz com um riso rouco

De escárnio e de sofrimento

Abandonar a luz ainda mais

Deixando a esperança para trás

E partir sábio, para o esquecimento.