Emboscada - um coração ferido

Certo dia, no sertão

Uma moça, pura então

Olhou para uns olhos de mar

E a eles quis encantar

Os olhos, seu corpo percorriam

E o desejo se fez urgente

E na poeira do chão quente

Esse homem, vil serpente

Tomou da moça o corpo

E quis com ele brincar

Essa menina corrompida

Logo depois do ocorrido

Quis dar cabo da própria vida

Fez no peito uma ferida

Com o facão de alma antiga

Da chaga ela se curou

Mas nunca perdoou

Aquele de olhos nublados

Que sumiu, em desagrado

Essa moça, magoada

Lembra sempre da cena passada

Chora sozinha, escondida

As lágrimas correm, sofridas

Pela face magoada e sem vida

Passaram-se um ano ou dois

E o homem voltou à cidade

Sem lembrar da atrocidade

Que em outros idos cometeu

Mas o pai da tal menina

Concluiu a sua sina

Usando o mesmo facão

Que feriu da moça o coração

E os olhos de maresia

Já não vêem a luz do dia

Caiu por terra o varão

Que não teve pena ou senão

Por causar tão sentida ilusão

Hoje, a beira da estrada

Num canto, numa encruzilhada

Pode-se ver uma cruz

E a placa lá fincada:

“Aqui jaz uma alma dura

Que muito fez padecer

Que venha a ele o caos

A desventura e o mal querer”

E assim termina a estória

Que guardei bem na memória

É meu destino lembrar

Que a moça que chorou

Ainda vive no peito meu

Ela é de mim um traço

Que hoje quero esquecer

Ou então ter outra sorte

Entregando meu viver

Aos braços da santa Morte