Lapsos de dor

Soneto I

A catalepsia do teu rosto

Hermeticamente fechado,

Me tortura o peito cansado

Já embebido de desgosto.

O sangue fervilha no meu encéfalo,

E tenho vontade de estrangular

Teu silêncio, e te fazer falar

Nem que seja um estalo.

Parece arquitetado de propósito,

Esse teu jeito insólito

E nocivo de me atormentar.

Inexoravelmente você se afasta,

Como se quisesse dar um basta,

Mas não quisesse me afastar.

Soneto II

Se meu coração fizesse fagocitose,

Eu não te amaria agora,

Pois ele te expeliria fora

Pensando ser uma virose.

É a síntese dos sentimentos antagônicos:

Amor e raiva, fé e descrença,

É como o beijo que transpira desavença

Mesmo que os lábios pareçam harmônicos.

Tu me fazes sentir essa síntese,

Que não consigo mensurar em tese,

Apenas senti-la me atordoar.

Não sei se há algo de divergente,

Ou se é você que é intransigente,

E não deixa o evidente ecoar.

Soneto III

Do tênue letargo à histeria

Um olhar muda de lado,

O peito fica apertado,

Adormece-se sem anestesia.

Meu raciocínio debilitado

Desmoronou boquiaberto,

Ao assimilar o teu timbre incerto

Por outrem haver se interessado.

Uma apatia profunda veio

A mim, e ainda não creio

Que eu tenha sido tão abestalhado.

Eu fracassei como um covarde

Que foge quando a luta arde,

Pára viver como um patife aguado.

Soneto IV

Quando você despreza meu afago,

Meu orgulho sangra pelos pulsos,

Meus dedos ficam convulsos,

A laringe fecha num só trago.

Teu olhar fica medonho,

Mesmo assim o encaro

Para contemplar teu escarro,

O teu tique enfadonho.

Consome-me numa labareda

Essa tua pele de seda,

Aterrorizando meu tato.

Então você puxa meu braço,

Teus dedos me prendem como um laço,

E eu fico acuado como um rato.

Marcos Paulo Silva
Enviado por Marcos Paulo Silva em 25/02/2010
Código do texto: T2106239
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