SE UMA CRIANÇA SOFRE. (Antonio de Freitas Bastos)

Calem-se os sinos

Nas tôrres,

Se uma criança sofre...

Estremeçam as tôrres

(admirações para o infinito)

Se uma criança sofre

Empalideçam as estrêlas

No firmamento

Se uma criança sofre...

Esmaeçam as flôres,

Não caia o delicado orvalho

Da madrugada,

Se uma criança sofre...

Lívida torne-se a aurora,

Triste o canto dos pássaros,

Se uma criança sofre...

O riso inocente das crianças

Brejeiras, felizes,

Também parece emurchecer,

Se uma criança sofre...

Sinos alegres,

Sinos plangentes,

Emudeçam!

Não toquem mais,

Se uma criança sofre...

Quando o riso

Feliz de uma criança,

Desaparecendo lhe endurece a face,

Tudo fica suspenso:

A bondade, a maldade e a dor:

Tudo pára,

Quando uma criança sofre.

Quando a criança

Tem este destino,

Só um sino

No seu badalar soturno,

Plangente,

Toca uníssono, saudoso,

Nos corações dos pais,

Se uma criança morre...

ANTONIO DE FREITAS BASTOS.

in memoriam

Poesia escrita por meu pai, médico pediatra, entre 1956 e 1957, após o falecimento de minha irmã Regina Maria.