Sonho em Fim

Vou enterrar meu sonho perfeito

Na areia da praia, em noite escura

Deito na cova úmida e fria

Toda a beleza que ousei desejar

Véus de orvalho que me ornaram um dia

Meus céus vestidos de alegria pura

E todos os risos agrilhoados no peito

Vou enterrar meu sonho sem perdão

Na tumba macia de ar vacilante

Ouvindo o requiém do mar contrito

Na ausência de adornos ou guirlandas

Não haverá intenção de um suspirar aflito

Nem soluço marcado em tom dissonante

Sequer o recitar da derradeira oração

Vou enterrar meu sonho destroçado

Pela vil esperança de felicidade

A cobrir-lhe a face com farta certeza

Suportando convicto as mazelas da sorte

Lutou bravamente por sua nobreza

Mas as forças terríveis da realidade

Ruíram em fúria seu universo delicado

Vou enterrar meu sonho sem alarde

No silencioso discurso da perda tamanha

Sem qualquer manifesto de dor ou desespero

Ou fugidia lágrima que anuncie o pranto

Nessa hora se exaure o que foi verdadeiro

E da inocência que se perde, nada se ganha

A não ser o desejo que a morte não tarde

Vou enterrar meu sonho querido

Cantarão os galos nas madrugadas

Anunciando rotineiros cada novo dia

O mundo seguirá seu tedioso ciclo

Sem perceber-me a alma torpe e vazia

Nem minhas mãos em pedra talhadas

E a estátua cega de olhar perdido

Claudia Gadini

22/09/05