Faço-Me Rei

Nu desde o mais oculto

Recôndito meu revelado

Na mais profunda rebeldia

Dos meus laços,

Vejo-me no imenso rio,

Navegável por excelência,

Do teu infinito reino.

Coroada estás plenamente,

Tão rainha que és

Da premente satisfatória

Energia primal de toda magia,

Magia esta de toda nobreza,

Nobreza esta de toda certeza,

Certeza esta de qualquer verdade.

Faço-me rei sem trono,

Tronos são pó,

Pois apenas o pó reina

Quando somos enterrados,

Envoltos por uma madeira

Abaixo de um solo

Que pisamos quando mortos vivos.

Vem a minha realeza

De uma célula ínfima

De alguma talvez esperança,

A dádiva de quem sofre,

Ruptura dos fortes,

Fortaleza dos fracos,

Firmeza dos mornos.

Forte eu sou,

Fraco eu seja,

Morno sempre serei,

Tudo é tríplice sofrer

Pois faço-me rei

Sem ter uma rainha por mim coroada

Todo dia a todo mês.

A rainha,

Aquela rainha coroada,

Ígnea fonte de tempestades,

Ocorrências do meu Ser,

Ser natimorto desde primeira idade,

Vagando como um zumbi

De muitos anos nas idades.

Pálida és minha soberania,

Vazia torpeza vadia,

Insatisfatória formação real,

Um leque não-aberto

Numa essência não-governada

Por ser uma crença não-tida

Num livro não-lido.

Este é o rei sem rainha por ele coroada,

O torpe fracasso representado,

Nascido para ser deposto

Do ilusório trono de sempre,

Vagamente almejado tanto

À luz de uma soberana

Que vassalo me torna.

É a minha soberania

O véu da densa inatividade

Da fundação de um reino,

Pois sou coroado

Pela fulminante certeza

Do não-amor por mim

Em cada rainha por mim coroada.

Rei para o nada distante sou,

Faço-me rei reinante

Na coroada dor da manhã,

Na coroada dor da tarde,

Na coroada dor da noite,

A dor já esposa,

Minha única rainha por mim não-coroada.