“Interface”

Saio da boca sem dente,

Vasto caminho sigo sobre espinhos.

-- Me ferem os pés.

Faz tempo que não vejo a cor do outono,

enxergo o cinza do inverno,

Como o cinza viaja em minhas veias.

Laminas descompassadas abrem

Caminho na minha pele, “remorso de uma

Morte-vida, uma vida sem vida, inerte”

O livro da vida corre de trás pra frente,

Volto na serpente que me deu no seu

Cálice o sangue que tomara como vinho,

Flashes me dão a dor, de uma vida obscura.

Mas não me faço lembrar dessas feridas,

Que deixei gangrenar em outrem,

Minha vida ou anti-morte, não me dizem

O que preciso saber, porque só lembro da rosa

Em seus cabelos, sobre uma lente

Em preto e branco,

Por que não sinto o amor que rasga o coração

E faz a alma levitar sobre um jardim florido.

-- Porque?

O céu não me dá respostas, e a cada manhã,

Sinto me mais perto da morte,

As imagens me crucificam e as lágrimas queimaduras

Em meu rosto, “lembrar”

Preciso lembrar desta minha vida,

Do outro no espelho, da outra face que só,

Enxergo os olhos, da metade do coração que se entregou

ao silêncio.

E vegetativo sou eu, carne cobrindo ossos,

Fotografias cerebrais famintas de uma vida vaga,

Onde uma rosa me enche a memória

E o abismo está a um passo,

a vida é um quebra cabeça, incompleto,

como uma peça, sem platéia somente o destino

abrindo as cortinas “o teatro da dor”

a imagem, vejo no reflexo,

Vestido de preto vejo meu eu,

Dono de minha outra vida.

Divido o mesmo palco,

Eu e minha rosa, ele e a dor de mim,

Sobre meus olhos as lágrimas e nos dele

Queimaduras,

no meu corpo lembranças

No dele gangrena,

alivio me tomam o corpo mais dele a raiva é pesada,

Nos meus pés o cansaço, nos dele espinhos,

O colorido consigo rever, sobre o preto e branco

Em suas veias,

na minha saliva o gosto do vinho,

Nas mãos dele o cálice vazio,

vejo o meu avesso,

Me sinto primavera, e vejo que a tempestade é ele,

são tantas as duvidas nas certeza que vejo dele,

“certezas em minhas duvidas”.

Preciso abortar esse “eu” que eu criei.

Mas dentre um estante, em meio a um segundo,

vejo meu reflexo na íris dele,

E sua alma em minha pele, “sinto frio”

a voz dele germina de mim,

percebo que dogmas que me fiz marcar,

criaram vida

e que dias sempre serão tempestuosos,

Pois ele é minha víscera, minha entranha,

“Meu filho”

E que sempre estarei quase morto,

Com ele vivo dentro de mim.