Rosas ao nosso funeral

as boas notícias tiraram férias.

a lição tira cascas da carne viva,

a paz suicidou-se, cansada – delicada.

o amor floriu uma rosa albina, queimada pelo sol

e a roseira – que é vermelha, e não rosa

sangrava e maldizia aquela branquela solitária.

o certo e o errado mudaram-se, foram-se embora

alguns dizem que para os pólos: errado ao sul,

certo ao norte, mas pode o contrário, pode a rosa outra vez…

o sol se pôs de vez, acho que morreu de velhice, chama da vida…

a Terra caminha negra, desabada – os tratores esmagaram tudo!

de morte e de matarem-se, gente muita disse adeus…ou não disse nada!

a vida mostrou-se uma assassina implacável:

o poeta que não adiantava morrer, morreu por diversão;

tornou-se em anjo torto – sopra doçuras dolorosas e flores, na rua…

e nada provou ser o mesmo, ou foi tudo provado

faltam evidências, no entanto, faltam evidências matemáticas, metafísicas, imaginárias, loucurísticas

faltam! todos vêm e vão para Pissiruca Nenhuma, nos ônibus lotados

a vida que sobrou soa tão confusa que as ruas perderam o sentido!

as placas são mentirosas, as calçadas estão pesadas de pés;

o planeta pende no espaço, pesado. cansado de girar, gritou dia desses:

– Chega! Estou ficando tonto, as entranhas queimam-me o humor! – doidera…

isso passa diante de nossas janelas, e o cego que não vê, sente.

em sentindo eu vou, com aquela rosa albina brotada no peito,

que corta e costura no coração, rasgando minha pele, irreversível…feito uma tatuagem!

que aperto que me dá, que choro patético, que tudo é esse que erra tanto?!

seguir em frente é um soco na cara, de mão cheia, carregada!

mas, vá lá, abro a porta e sigo mundo; ignoro, também, o que todo mundo finge não ver – sou mais um, tenho de ser

a multidão é uma sala de espelhos: todos os olhos roxos, caras inchadas da bofetada diária – seguir em frente…

viver a tristeza é um manual de bom uso, é sim, é claro

diz-se lá: não espere, não desejes, as boas notícias tiraram férias,

a paz suicidou-se, o poeta morreu ainda não adiantando…

é só um manual, ninguém lê…ninguém nunca lê nada!

o sol morreu velho, rugado de anos infinitos, expirou

e eu demoro a envelhecer, talvez nunca morra nem viva: sou um eterno velório triste…

Vinicius de Andrade
Enviado por Vinicius de Andrade em 02/11/2012
Reeditado em 02/11/2012
Código do texto: T3964972
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