Fingir não sentir dor
Fingir não sentir dor parece bom
Mas quando na verdade o que não quero mesmo é ter que aguentá-la
Não quero mais ter que me curar e me remediar de uma ausência
Que nunca vai acabar.
Parece estranho, mas uma grande parte de mim se contorce de dor
E me consome pelo dia inteiro quando lembro desses fatos desastrosos de perdas de vidas
Parece estranho que eu tenha sentido tanto, mas tanto que as lágrimas não fazem cerimônia
Para rolarem abaixo dos meus olhos e eu ter de enxugá-las discretamente para não ser notado
Fingir não sentir dor me tem ajudado a seguir meu dia como eu seguiria na existência dela
Mas eu sei!
Ela está lá!
Ela está aqui!
Ela está em todo lugar que eu olhe e em todo lugar que eu me dirija!
Ela está lá!
Fingir sua inexistência parece um remédio amargo,
Como daqueles injetáveis que correm ardendo as veias
Causando um estorvo quase impossível de aguentar
E mesmo assim aguentamos.
Parece estranho que eu tenha sentido tudo isso antes mesmo de acontecer
E mais estranho que eu sempre aja com tanto medo sempre que saio de casa
Achando que algo ruim vai acontecer.
E todos nós sabemos que algo sempre pode acontecer.
Daí que eu me permito dizer que sinto falta.
E me permito meditar sempre que posso ou quando estou sozinho.
E me permito aproveitar os dias e as horas que tenho para dizer algo
Ou fazer algo a mim mesmo ou a alguém.
Fingir não sentir dor não faz diferença
Mas me liberta do olhar vazio para o teto do quarto
Dos arrepios, dos gritos, da presença surda e muda de uma lembrança
E dos pensamentos acompanhados de um aperto forte
Que todos sentem quando lembram dos que não voltarão para casa.