Fazia tempo

Fazia tempo,

que eu não cuspia ao vento

e o mesmo voltava em minha cara.

Fazia tempo,

que eu não escarrava aos céus,

e este, então, caía em meu rosto.

Fazia tempo,

que eu não vomitava para cima,

e o vômito retornava para minha própria boca.

Fazia tempo,

que eu não vociferava palavras, como se soubesse,

e tinha de engolir de volta as mesmas.

Cuspi palavas, e elas voltaram à minha boca;

escarrei atitudes, e estas vieram como barro.

Vomitei certezas, e, respectivamente,

bateram de volta contra meus olhos;

como refluxo voltaram, tive de engoli-los,

no gosto azedo, no sentimento decadente.

Fazia tempo,

que meu coração não ascendia,

ao vento ia, aos céus acendia,

e este mesmo fora regurgitado.

Fazia tempo,

que eu não subia com minhas cordas,

com meu cinto, com meu equipamento,

e caía, batendo a cabeça em chão duro.

Fazia tempo,

que eu não via um gigante destruindo as muralhas,

conquistando impérios, estraçalhando crianças, devorando pessoas.

Fazia tempo,

que eu não via muros intransponíveis sendo derrubados

como pó e seu povo sendo exterminado;

pequenos sendo comidos, mulheres grávidas torturadas,

reinos e reinados sendo queimados,

gigantes estraçalhando e sendo estraçalhados,

cadáveres sendo alimento e adubo.

Fazia tempo que meus olhos não contemplavam

o terror, o pânico, a alma sendo transpassada:

o SENHOR fizera tudo isso.

Tive de engolir minhas próprias palavras,

degustar meu próprio vômito,

comer o barro que fora feito por meu grosso.

Tive de ter sido quebrado em minhas certezas,

humilhado em minhas convicções.

Meus planos foram comidos,

mas logo regurgitados; como comida estragada,

assim foram meus patéticos planejamentos:

vomitei-os em mim mesmo,

tive de, como sopa, tomá-los - minha própria vomição.

Fazia tempo,

que eu não me vomitava,

que o vento, quente e ofegante, não trazia de volta

meu próprio escarro, meu sentimento pigarro.

Fazia tempo,

que eu não era humilhado, posto ao escabelo dos pés,

vomitado em terra, subjugado.

Fazia tempo,

que eu não era majestosamente pisoteado,

pisado, açoitado, amado.

Eu sempre fui, sempre sou,

e sempre serei Reinado.

Mas, agora vejo melhor minha escravidão;

fazia tempo que eu não me via ser escravizado.

Sempre fui, sempre sou, e sempre serei

escravo, preso, sem liberdade para lado algum.

Cesare Turazzi, em tudo capacitado pelo Altíssimo.

[30/06/13]

Cesare Turazzi
Enviado por Cesare Turazzi em 30/06/2013
Reeditado em 30/06/2013
Código do texto: T4365241
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