Inteiras só as palavras

Nada me retêm, nada me segura.

A pele não contém a alma que em contraponto, escorre

nas vastas águas, fontanários. De outras águas.

Hoje queria-te aqui

e tu não estás. Não estás quando a Lua vai embora

Quando o Sol insiste em me acordar

Quando o mar grande é gemido aprofundado

na caverna letárgica dos sentidos.

E quando pássaros melopeiam trinados (des)afinados

aos meus doridos ouvidos. Povoam-me impunes os silêncios.

Oiço-te os passos – laços e ao mesmo tempo, lentos e comprimidos,

aos meus sempre colados. Adjacentes, ausentes e tão presentes.

Só. Sinto-me só. Vagabunda d’alma, arejo do próprio vento.

Perdida na brisa do teu lamento.

Perdida de mim, num qualquer momento … perdida de ti,

nos passos avessos que dou fora de mim.

Não sei quem sou

Não sei se existo

Não sei sequer se este cheiro permanente

a sangue coalhado a quente,

estas feridas internas que não estancam, sangram

cisternas profundas a ecoarem no vazio absoluto,

esta pele violácea, na cor do luto,

esta salinidade a escorrer-me nas entranhas,

são verdadeiras.

Inteiras só as palavras.

As que escrevo alinhavadas, na noite das minhas madrugadas.

Mel de Carvalho
Enviado por Mel de Carvalho em 08/04/2007
Código do texto: T442348
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