Em Regresso à Casa dos Loucos
Os psicóticos esperam na sala de paredes cor salmão.
A Secretária enfadonha matraqueia sobre os últimos
mortos e sobre a política;
os dedos turvos da loira, amarelados pelo filtro do cigarro,
tocam-me as pernas; sinto a tristeza dos seus dedos
penetrando por minhas calças e invadindo as minhas
doentes membranas;
ela chora pelo marido pisoteado por militares,
chora porquê a sogra arrancou o último tostão
que ela usava para amamentar os filhos fracos,
os filhos fracos que cagam no chão da casa,
os filhos fracos que não tomam leite há um mês,
enquanto a Secretária matraqueia com o pequeno
clérigo que diz ter visões de Deus;
"Oh, mas porquê Deus permite tantas doenças?
Tantas mortes?"
Somos suicidas ao sair de nossas casas,
somos suicidas por termos mentes,
somos suicidas por ligarmos o fogo todas as
manhãs para sentir o cheiro de café;
mamãe ao meu lado os contempla, vovó um dia viera
por estas bandas, agora, a onda do tempo empurrara
como um pequeno pedaço de pau seu filho
líquido; incapaz de ficar de pé pela segunda vez,
sentindo-se fatigado ao ouvir a voz da Secretária
dizendo e dizendo tantas coisas sem sentido que
ele mesmo se pergunta porquê aquela mulher não
encontra-se ali como uma paciente;
teus pensamentos imersos nos vendavais,
teus pensamentos imersos nas obras de Goya,
teus pensamentos imersos no necrotério onde sua avó
encontra-se putrefata,
incapazes de realizar sinapse,
mais uma vez sentado à poltrona do psiquiatra,
em regresso à casa dos loucos.