PORCELANA

Por ser Lana,

todos a achavam moderna.

Mas Lana era apenas

uma Dorotéia

em seu sonho medieval.

Casta, guardava-se

para aquele que a devassaria

com a gentileza de um colibri.

Abria a janela,

olhava o lá fora

e suspirava

como uma avezinha

flanando sobre o ninho.

A mãe dizia:

Lana,

pára de sonhar e vem me ajudar

a lavar os pratos,

a varrer a casa,

a limpar a varanda,

pois o vento trouxe

um redemoinho de pétalas e folhas!

E Lana lavava os pratos,

varria a casa,

limpava a varanda

cantando

uma cantiga de amigo.

Lana não era moderna:

seu pensamento

era um romance adocicado.

Apareceu um.

E, ao ver Lana à janela,

jogou sua flor de sedução.

Dorotéia cantou

com a voz de Lana

o seu sonho de amor.

Em pouco tempo, ela deixou

sua pele de porcelana

nas mãos de um.

E aquelas mãos a devassaram

não como um colibri,

mas como um falcão

em plena predação.

Aquelas unhas arranharam

e macularam permanentemente

a pureza, a limpidez

da porcelana.

E ela só acordou tardiamente,

quando aquele um

sumiu na curva da estrada.

A mãe, ao perceber o lanho

na pele de porcelana,

disse:

Lana,

a tua casa não é mais aqui!

Não lavaste os pratos,

não varreste a casa,

nem limpaste a varanda:

ficaste à janela

e recebeste o castigo

de um amor assassino...

Lana encheu suas malas

com os panos que a vida lhe deu.

E, com poucas moedas, partiu

para conquistar o mundo.

Dobrou a curva da estrada,

mas porcelana marcada

não valia nada

naquela cidade voraz.

Hoje Lana vale

algumas moedas

por duas horas de ilusão.

Viviane Rolando
Enviado por Viviane Rolando em 29/05/2007
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