CASINHAS AMARELAS

Eu sabia exatamente o que lhe dizer,

mas hoje, neste seu aniversário,

realmente eu não sei.

Aliás, antes eu escolhia,

dentro as muitas idéias que eu tinha,

uma para pôr em prática.

Naquele contexto era tudo tão à mão,

tudo tão ao coração, à intimidade.

Eu pensava, ora em livretos, ora em cartas.

Eu tinha, pelo menos me parecia,

toda uma abóbada tingida de mundo.

Com muitas casinhas.

E parecia que em todas aquelas casinhas

– em cada uma – existia uma estória.

E existia uma lua,

uma cortina de cor que nunca tinha visto antes,

existia uma jarra com qualquer-coisa-que-eu-deseje-beber-na-hora,

uns livros encima duma mesa e outros em seu pé,

mas não existia mesa,

havia uma parede sem nada

e uma janela para outras casinhas.

A cortina de uma casinha que encontrei certa vez,

tinha cor do seu cabelo quando preso.

Por diversas vezes me vi espelhado numa das paredes.

Aquelas casas eram muito coloridas entre si,

mas eram tão meigas quanto casinhas amarelas.

Ficavam numa colina, que não me lembro de que cor era.

Por vezes ia eu, em forma de três,

fazer o que me era proibido.

Não era nada proibido, mas, então eu não fazia nada?

Não, eu fazia.

Lá não havia lógica matemática,

havia coisas e casas e casos e cascos e acasos.

Hoje, me parece ter sumido tudo isso.

Não podemos, pois, viajar mais no que nem mais existe.

Estou sóbrio, mas extremamente triste.

Me agradava demais falar naquele lugar.

Falar lá, falar de lá.

Eu escorregava por uma costa do morro

e na outra umas nuvens me suspendiam.

Assim eu nunca cansei minhas asas.

Ás vezes eu queria imensamente cansar meus braços

e subia numa corda de trapos que,

ao mero estender de minhas mãos, me vinha.

Por falar em vinha, havia vinhas.

Perto das casas do lado de cima daquele lugar

em que umas ruas têm forma de E elas se punham.

Havia um barril imenso, mais para moringa que para barril.

Nele eu roubava vinho.

Pelo outro lado de tudo,

havia uns moços e umas moças que me admiravam.

Talvez porque e os havia ajudado a construir suas casas.

Pois eu dotava de mãos imensas,

muita força,

muita força.

Suas casas eram rudes, mas amarelas.

Amarelas, mas sem expressão.

Eu adoro aquelas casas. Eu os amo.

Hoje, me parece ter sumido tudo isso.

Não podemos, pois, viajar mais no que nem mais existe.

Estou sóbrio, mas extremamente triste.

Das janelas das casas dos que me admiravam

Dava para ver outras daquelas casinhas

e no horizonte havia mais.

E outras. E outras. E outras.

As quais tinham suas janelas.

E, como todas, não tinham porta.

Eram tão que nem eu via que nem imaginava.

Vi umas dez mil vezes cortinas que me remetiam a seu cabelo.

E gostei todas as vezes que vi.