ESSES DIAS (UM POEMA TRISTE)

O dia hoje é um poema triste.

Ontem foi um poema triste.

Tristes, sentamos à mesa

e, de canetas sangrando, escrevemos:

chove mais dentro de nós

que na rua.

Caminhamos lado a lado,

uma solidão acompanha outra.

Meu Deus, o que é dos homens?

Por que tanta desfaçatez?

Os falsos amigos do morto

clamam uma falsa justiça.

Eles matam a tantos

e clamam justiça.

Mentirosos.

Não se importam com a dor

de quem perdeu o eixo da vida.

Fotografam, perguntam, atiçam, acusam

e expõem.

Constroem um museu de sangue

e lágrimas.

E a dor de quem perdeu?

Não há como dividir com outrem.

É única.

Mas o repórter pergunta:

quem perdeste?

A quem acusas?

E fotografa e filma e grava o som

da dor alheia.

Homens tolos acreditam

que uma imagem vale

mais que mil palavras.

E reiteram a imagem

e a multiplicam:

milhões de palavras soltas,

quem poderá entendê-las?

A dor, a grande dor

explode em grito:

mas na alma ela queima,

vulcão subterrâneo.

Wanda Maia
Enviado por Wanda Maia em 24/07/2007
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