sete vidas mortas
Esta aurora
possui um pouco
de despedida;
esta aurora
possuía
um animal
de sete vidas;
esta aurora
possuía
um veículo
que possuiu
as sete vidas
– e nada
se alterara,
não há impacto;
porque nos acostumamos
a morrer
e a ignorar que
instantes antes
havia uma,
ou melhor,
sete vidas
que a urgência
motorista
decidira
tomar,
passando
por cima:
e isso é comum
na rua que deposita
os seus mortos
num terreno inabitado
num córrego
que fede
ou em sacos pretos
para as coletas
noturnas:
mas nunca
a dignidade
de um enterro,
mas nunca
a dignidade
de um enterro
Sete vidas
desapareceram
no sangue
e nos pneus,
e a aurora
se iniciara
normalmente,
dando a impressão
de que
nem mesmo
na morte,
a vida,
se valoriza
– tudo passara
a ser tão normal,
que este normal
assusta
se não nos enxergamos
preocupados
ou abalados
ou entristecidos
diante
de uma
perda
Sete vidas
desapareceram em
escuro silêncio
e a rua
e o bairro
e a cidade
e o estado
e o país,
funcionam
normalmente
– e o meu máximo
fora orar
na busca de
que algo ou alguém,
consolasse
esta
e tantas outras
mortes
que inda insistem
em tratar
como normal
ou como uma
mera falta
de sorte
*
*
Sete vidas perdidas
e as cousas
cotidianas
seguem
normalmente
– e isso me fere
profundamente
como o cruel impacto
de um atropelo