O Amor à Solidão
A solidão é a mais terna das formas
Através dela amamos a nós mesmos
Zaratustra não se amava
Pois não era si mesmo
Tinha cavernas, sol e cobras
Eu ainda tenho
Paredes, chão e portas
Tenho opções de
Mascarar minha dor
Em quilos de alimentos gordurosos
Até minha vesícula estourar
E ser digerido por ignorância
Até quando a solidão habitar
Unhas encravadas e nervos varicosos
O que resta é sentir
Até que um dia não suporte
Provavelmente um pai temível
Ou uma mãe amável
Não poderiam impedir de castigar ao corpo
A mente
A língua plastificada acima do frênulo
Trêmulo minhas mãos incômodas
Sensações autômatas invadem
Simulo não ser quem sou
Pois acima da borrasca ardente
Há o monte de lágrimas duvidosas
E nada posso fazer
Além de pedir redenção
Por isso admiro a claridade acima
Luz irradia e fagocita moléculas infames
Por isso prefiro a noite
Refletida e desconexa
Ainda existem bares
Mais um drink desce pela garganta
Todos estão a dançar
Minhas engrenagens rangem
Ainda preciso me desconectar
Enquanto cadáver robótico
Enquanto lua única rodeando
Um planeta intimo
A vida não apraz
Enquanto vagabundo momentâneo
Nada satisfaz
O peito ainda brilha mais que boates
Álibi da própria incompetência Em manter pessoas
Com vontades atestadas
Sol ainda queima
Almas fulguradas em cinzas
Observe a cidade da luz
Não existem pessoas
Enquanto poetas miram o infinito
E se cegam pela estupidez
Detenho-me a sarjetas
É lá que a poesia reside
Em um príncipe principiante
Executando ordens ínfimas
Num sonho de morte e temor à miséria
Engano meu
Onde está a poesia?
Nas ruas, trincheiras, guerra?
Paz perpetua?
Improvável
Nos prazeres, exclama Rimbaud
Num raciocínio mágico inconstante
Poesia é o universo finito
Ainda infinito em concepções
Daí estão os cegos
Inútil seja esse ciclo catastrófico
Quetzalcóatl se devorando
E eu ainda busco erroneamente
Consumar meu fim eterno
Sozinho
Mas estar sozinho
Não é necessariamente solidão
Os cortes escondidos talvez sejam marcas
Para uma outra história
De quando o amor à solidão
Não coube em mim