Requiem IV "A Escuridão"

A escuridão

A escuridão apaga meus sentidos

Leva o mundo ao meu redor

Impõe-me a mera sobrevida

Deixa meus pensamentos aflitos

Inundarem-se em espinhos e dor

Sufocando a alma até por si esquecida

A escuridão deforma a realidade

Leva ao limite a fadiga do tormento

Ceifa sonhos que a deleitam satisfeita

Na ânsia do sono que a ela vem sedento

E quando, enfim, cai no esquecimento

Conforma-se em recolher sua parca colheita

A escuridão que me sangra lentamente

Verte em fios o viver desse invólucro insano

Mero abrigo da assombração que arrasta

E cada gota a escorrer demente

Pinga lágrimas depostas no piano

Que amarga as notas da morte que abraça

A escuridão que encobre os dias

Traz sem piedade a morte inevitável

Chove penumbra sobre a alma vazia

Injeta o fel em cada pingo de ácido

Corroe a habitante da lápide fria

Extingue as cinzas do fogo esquálido

A escuridão que me fez insana

Que tortura, mata, e também sangra

Levou-me ao fundo de mim nos braços

Ensinou-me a ler a verdade dos compassos

Incrustados nos passos sempre em quebra

Da fermata eterna que acompanha

A escuridão que a noite amarga é secreta

Só se mostra aos portadores da lente certa:

A comoção da lágrima que escorre

O vácuo deixado pela morte que espia

O desespero do luto tenebroso a envolve

E vazio que a escuridão a cria

Ana Pismel
Enviado por Ana Pismel em 20/03/2008
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