Reconstrução

Deus,

Toma as minhas mãos

gordas e pastosas

inoperantes ainda que jovens

e quebra

uma a uma

as cartilagens, as juntas,

as falanges, as unhas.

Não, não te importes com a dor.

A dor me faz mais viva.

Parte, estala os ossos como lhe peço.

Espreme a carne pardacenta.

Escorre, entre os músculos e a pele,

o sangue grosso e coagulado

da preguiça.

Trincha cada parte, separa-a dos blocos,

e móe.

Móe bem.

E faze novas mãos.

Mãos secas e vivas

operantes (ainda que velhas e escuras).

Puxa meus dedos, alonga-os.

Porque sem a dor passada

sou nova criatura.

Com novas mãos, novo é o toque.

Senhor, dá-me o Teu toque!