Dos Anjos

De saia até o pé, toda feita de retalhos,

A Dolores das Rosas roda suas rendas.

Esquento o tambor, acendo minhas velas e rezo.

Rezo muito, muito mesmo!

Quase todo o tempo...

Peço prece, cura, proteção.

Peço pelo filho que segue na prisão.

Pela nora que há de parir mês que vem.

E pelas tantas outras almas que a seguem...

E são tantas... Ó, Pai!

Pretas, brancas, coloridas.

Sofridas, perdidas, encontradas.

São infinitas as que querem um alô!

E minhas mãos são quase de fada.

Escrevo, escrevo no papel de pão

E quando a entidade vai embora estou exausta!

Mas, agradeço por poder cumprir minha lida.

Sou querida por todos do terreiro,

Desde o sanfoneiro que virou adorador,

Até o senhor de escravos que veio bater tambor, depois da cura.

E ao som do tamborim, sai o estopim necessário para meu trabalho.

De amor, de encantamento, de pensamento bom.

O tambor bate, repica,

E a velha Maria aqui salpica

Umas rosas, oferendas.

São prendas aos mentores.

Afastam os horrores do dia a dia.

Eu bem que queria ajudar a todos.

Mas, não é assim que é.

É na rodada da saia

Que guardo os meus.

Cada pano, um bem-querer.

Cada renda, uma fenda a expor.

Com sabor de pipoca, paçoca e aguardente.

Dizem-me crente quase nada!

Ora, essa!

Quem são eles a duvidar de meu dom?

Herdei de mamãe, ainda menina.

E ponho em prática com gosto.

Seja a gosto de Deus Pai ou de Pai André.

Um axé é sempre bom!

Refaz a alma, retoca o tom.

E põe quem me procura a pensar.

Benzo criança, vovó e marido.

Falo com santo, orixá e entidade.

Com o coração aberto e vontade daquelas grandes!

Rodo a saia, ajeito o tabuleiro,

E se preciso, sacudo o terreiro todo.

Não tenho medo da prosa.

Sou da Rosa, dos Anjos,das orações.

Entoo canções aos que me ajudam.

E como ajudam!

Sou Dos Anjos, como me chamam.

De dia, de noite, a qualquer hora.

E agora se me der licença,

Vou voltar às minhas rezas.

Todas fortes, procuradas.

Para salvar toda essa gente que me bate à porta.

Meio torta, vou-me embora.

Saio agora, sem demora.

Se quiser, espere.

Posso lhe desatar um nó

Feito em cipó, num trabalho qualquer.

Coisa de mulher ciumenta

Que não aguenta lhe ver contente.

Mas, a gente resolve isso.

Ah! Se resolve, sô!..

HELOISA ARMANNI
Enviado por HELOISA ARMANNI em 11/07/2014
Código do texto: T4877832
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