Estou prenhe...

Estou prenhe de mim

onde não há corpo, toda forma é obsoleta

mas, não por ela carregar substância

e sim, por "não preencher o suficiente"

afinal,

a suficiência é algo que delimita, coloca margens

para dizer: até aqui, é o suficiente

mas, não... não somos beiradas de rio

ou mesmo um mapa que desenha-se em continentes

não há suficiência que nos caiba

somos ar e fogo

terra e água

e por isso, prontos para nascer

naquele que somado, de tão junto, nasce outro

a suficiência não nos define e nem nos projeta em lugar algum

ela tão somente é à serviço do preenchimento

e neste, não abre espaço, não se abre a qualquer outro em nós

é preciso largueza, útero, vaga para caber

por isso, todo silêncio é morte

que em nós, aduba a terra e abraça a semente

que em seu broto rasgando a pele

permite ao ar, ao sol, se oferecer

sim, somos entrega ao Todo, em nós

a estes braços ardentes da chama que de lá das alturas,

nos faz crescer, nos alimenta

chama esta, alimentada por sua vez, daquele que invisível

não faz questão de se mostrar

é rarefeito e apenas sopra, respira e em alguns momentos uiva

para dizer de sua presença

se me permitem a ousadia

até poderia dizer: estamos todos prenhes de nós

deixar-se e abandonar-se à nós, sem suficiências

é o beijo da vida que não perdoa

por isso, parece queda, desmanche, caos

inquietudes tantas que não nos remete a natureza da mesma;

vicejar abundantemente,

mas quando passar o aturdimento,

nos permitir aos arroubos da semente que arde

e por nós transborda, saberemos...

...sim, estamos prenhes de nós!

Kátia de Souza - 21/08/2021