Quem me vê não diz quem sou

De repente me vi por ali

ultrapassando aquela porteira...

Ao meu lado meus irmãos,

um cavalo de nome Castanho...

Menina meio caipira meio sabida,

esquecida do seu momento...

Cheguei ao mundo!

Tomei consciência de tudo naquela fronteira

ao morar num suntuoso ranchinho

de pura madeira roliça e sentar-me no chão...

Ao fundo um riacho, um pé de veludo,

trombas d’água e eu enchendo um baldinho, a sonhar!

Aquilo era riqueza, curtos caminhos longínquos...

Menina meio real, meio poetisa...

Aprendi a ler com a brisa que banhava as paredes vegetais...

Ouvindo meus pais penetrei o mundo e a vida...

Ali viajava todos os dias, num cavalo chamado Castanho.

Conheci cidades fantasmas, o Taperão...

Vestia retalhos, não tinha laços para os cabelos.

Quantas lembranças... Quanta riqueza era a vida!

Ali desenhei o início de minha anônima história...

Castanho... Meu cavalo sem arreios...

Depois me achei na cidade, aprendi o que era centro,

fogão-a-gás, feira livre, escola, igreja, ditadura, dinheiro,

mas nunca deixei os meus quintais,

o meu baldinho, o cavalo Castanho...

Segui na estrada sem asfalto que inda hoje existe...

Ultrapassei outras porteiras...

deixei o jeito menina, o jeito caipira, o jeito sabida,

perdi o suntuoso ranchinho e hoje me vejo, por aqui...

Já não tenho o cavalo Castanho, que pensava ser meu...

Já não visto retalhos...

Quem me vê não me vê naquele ranchinho

nem nessa essência meio real meio poetisa,

o barulho do riacho, a brisa que ensina a ler...

A inquietude da infância, coisas que guardo em mim,

a simplicidade e os pés no chão, a poeira da estrada,

o mundo deixado pelos meus pais...

As saudades que aprendi, a riqueza que não se compra,

sonhos que não se apagam, beleza que não se explica,

o ser que não se consome,

o sentimento que ninguém reconhece!

Nalva
Enviado por Nalva em 11/03/2006
Reeditado em 12/07/2008
Código do texto: T121762
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