Onde aprendi a sonhar...

A casa da minha infância era mágica

Uma casa cheia de sonhos

Casa grande sem senzala

Portas largas e janelas

Cômodos onde nos escondíamos

Pra fugir do castigo que sempre vinha atrás das traquinagens.

Naquela casa, fotos contavam histórias

Cada canto um segredo

No relógio da parede

O tempo se fez presente.

Tinha cheiro de café, sequilhos,

Tapioca com nata e bolo de fubá.

Tinha o calor de gente

E do fogão à lenha

Onde minha avó cozinhava.

Os dias eram curtos, as brincadeiras fantásticas...

As noites, estreladas...

Milhões de olhos na escuridão,

Via o Cruzeiro do Sul

Quase ao alcance da mão.

A luz da lamparina acompanhava a leitura

Os monstros de sombra se multiplicavam

Intervalo pra brincar

Em meio a tarefa escolar.

E lá existiam árvores, muitas árvores,

Pés de manga,

Laranjeiras em flor

Até um lindo riacho

Enchia nas invernadas.

Tempo de mergulho,

Medo e perigo não habitavam o nosso dicionário.

Como as horas na escola custavam a passar!

Na minha casa tinha gente, tinha bichos, brinquedos de lata,

Bruxas de pano, sabugo de milho,

boiada de ossos.

Tinha vida... tinha sonhos

Era uma casa cheia de cantos e... encantos!

Até uma lua intrometida

Bola cheia a espiar

Pelas frestas atravessava

Sua luz a nos olhar.

Nas noites enluaradas, pega-pega,

Tica-cola, a criançada brincava

E a noite era dia na imensa claridade.

Tinha goteira na telha,

cantarolando contente.

Tinha colcha de retalho

Nos aquecendo do frio.

Minha casa escondia um tesouro

Uma arca da fantasia

Cheia de histórias

Somente a minha avó tinha a chave

E à noite quando sua voz se ouvia

A criançada vivia um momento de pura magia.

Nesta casa fui criança, fui princesa, escritora ,

Fiz um circo e fui palhaço, bailarina, trapezista

Em foguetes viajei, muitas nuvens desenhei,

Personagens inventei. Muitos amigos encontrei.

Na casa da minha infância tantos segredos guardei

Hoje quando a visito até parece que vejo

Uma menina arteira a me espiar

Encontro todos os meus personagens

Correndo nos corredores, eles ainda se escondem de mim.