SONHO PERDIDO

Menino inocente que nasce na mata.

Correndo descalço na terra vermelha.

Tangendo boiada abrindo porteira.

Tocando berrante comendo poeira.

Sonhando um dia em ser vaqueiro.

Campeão de rodeio...

famoso em todo sertão.

Menino inocente que cresce sonhando.

Ouvindo o berrante de outros tropeiros.

Correndo feliz por muitas veredas.

Montado contente em seu cavalo alazão.

Menino inocente que cresce na mata,

pegando na mão borboleta e lagarta.

Sentindo no rosto, de abraços abertos,

e olhos fechados, o vento soprando do ribeirão.

Menino inocente que em tempo de seca abandona o sertão.

Abando o sonho de ser vaqueiro e também campeão.

Deixa pra trás a família e amigos.

A Ritinha chorando no quarto de tanta emoção.

Em um canto qualquer o gibão de couro.

Em outro, morrendo de fome e de cede...

o cavalo alazão.

Menino inocente no ônibus fretado.

Chorando calado por sua opção.

Leva consigo só a roupa do corpo.

Angústia no peito!...

e muita recordação.

Menino inocente que chega em São Paulo.

Papel amassado no bolso rasgado.

Endereço escrito de uma pensão.

Menino inocente que fica encantado,

olhando para alto com admiração.

Em sua volta prédios gigantes.

Gente gritando. Gente correndo.

Barulho de carro e poluição.

Menino inocente que vira indigente.

Que chora e grita como demente.

Que vaga perdido por ruas e becos,

comendo do lixo pedaço de pão.

Menino inocente que sonha um dia voltar pro o sertão.

Sonha rever a família e amigos.

Correr novamente por muitas veredas,

montado contente em seu cavalo alazão.

Na garupa, a Ritinha vestida de noiva,

de braços abertos e olhos fechados,

sentindo no rosto o vento soprando do ribeirão.

Menino inocente que dorme na rua.

O vento soprando no papelão.

Pés descalços. Coberta furada.

Olhos em lágrimas. Angústia na alma.

No bolso da calça migalhas de pão.

Menino inocente que sofre calado.

O corpo gelado tocando no chão.

Menino inocente que não resiste ao frio e a fome...

que morre sozinho no meio da escuridão.